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Opinião

«Os enfermeiros são potenciais diagnosticadores da Esperança, um estado que pode ser otimizado»


Pedro Melo

Especialista em Enfermagem Comunitária. Professor auxiliar convidado do Instituto de Ciências da Saúde/Escola de Enfermagem da Universidade Católica Portuguesa



Eis que começa um novo ano: 2021. Nunca teve tão significado a mística da mudança de ciclo como nos tempos em que vivemos. Nos media e nas bocas, por todos os recantos, a palavra de ordem é Esperança. 

Associada ao início do processo de vacinação contra a covid-19, ainda no final de 2020, mas que permitirá atingir, durante 2021, a tão esperada imunidade de grupo para o SARS-CoV-2.

A palavra Esperança, contudo, mais do que um substantivo, é um estado que pode ser diagnosticado e otimizado. Para além da pandemia, o estado Esperança está presente em continuidade nas nossas vidas.

Pareceu-me lógica, quase óbvia, a decisão de explorar a Esperança na coluna “Diagnóstico de Enfermagem” do início de 2021. A Enfermagem, enquanto ciência, tem estudado a Esperança de uma forma muito aprofundada, principalmente nos últimos 20 anos.

No catálogo de diagnósticos da NANDA-I, existe o diagnóstico de enfermagem “desesperança”, assim como a “disposição para a esperança melhorada”, dentro da classe “autoconceito” e no domínio “autoperceção”, sendo a Esperança, por isso, um foco de atenção dos enfermeiros.


Pedro Melo

O diagnóstico de enfermagem “Desesperança” foi aprovado mundialmente em 1986, sendo revisto regularmente até hoje.

É descrito como um “estado subjetivo no qual um indivíduo vê alternativas limitadas ou não vê alternativas ou escolhas pessoais disponíveis e é incapaz de mobilizar energias em benefício próprio”. Tem como critérios de diagnóstico, entre outros, “alterações do padrão de sono, apetite reduzido, contacto visual insuficiente, diminuição no afeto, indicadores verbais de desânimo, passividade, etc.”.

O diagnóstico de enfermagem “Disposição para esperança melhorada”, aprovado em 2006 (o que denota a tendência das ciências da saúde se focarem nos seus focos pela positiva e não pela visão biomédica da doença), é definido como “Padrão de expectativas e desejos para mobilizar energias em benefício próprio que pode ser melhorado.”

Os critérios de diagnóstico, neste caso, estão centrados na expressão pela pessoa de um padrão de expectativas e desejos para mobilizar energias em benefício próprio que pode ser melhorado, aumentar a crença nas possibilidades, aumentar a perceção de sentido da vida, melhorar a capacidade de estabelecer metas alcançáveis, melhorar a conexão com os outros, melhorar a espiritualidade”.

Estudos internacionais desenvolvidos por enfermeiros como Benzel, Berg e Davis, e, ao nível português, por Zaida Charepe (no contexto dos pais de crianças com doença crónica), ou Vera Cavaco e colaboradores (revisão sistemática da literatura) são exemplos de evidências sobre o papel da Esperança na saúde das pessoas.

Percebe-se então o papel fundamental e insubstituível da Esperança na Vida e a importância de serem monitorizados os níveis de disposição para a esperança tanto como os níveis de hemoglobina e de glóbulos brancos no sangue. Pela evidência descrita, os enfermeiros são potenciais diagnosticadores da Esperança, já que se focam nos processos de vida das pessoas e têm um nível de evidência diagnóstica bem estruturado e validado.

Na minha prática clínica, como enfermeiro de família, e agora como professor e investigador sobre a Saúde Familiar e sobre os fatores de empoderamento das pessoas, confirmo que sempre avaliei a Esperança primeiro enquanto dimensão diagnóstica do foco “Processo de Tomada de Decisão”, onde o enfermeiro de família, nomeadamente nas consultas de saúde do adulto ou de saúde juvenil, diagnostica a Esperança de acordo com os critérios descritos na NANDA-I. 

Estou convicto de que a Esperança, pela evidência produzida, deve ser encarada como um foco principal e não como dimensão diagnóstica, no que respeita ao diagnóstico de enfermagem. A investigação em contínuo desenvolvimento confirmará isso mesmo.

Deste modo, no contexto da vida das pessoas, o enfermeiro, enquanto “coach em saúde” por excelência, potencia o diagnóstico e desenvolve intervenções e prescrições promotoras de Esperança, arquitetando um ambiente externo e interno às pessoas que lhes conferem um Sentido de Si e da sua Vida.

Esta é também ela uma mensagem de Esperança, saber que há uma ciência e uma profissão focadas em estudar e aplicar a investigação e as evidências neste foco e potenciando assim a Esperança em cada um de nós e potencializando os níveis de Esperança no Mundo.

Desejo a todos os leitores do Jornal Médico dos cuidados de saúde primários um 2021 pleno do essencial para a sua vida ter sentido. Entre este essencial está a Esperança.



O artigo pode ser lido na edição de janeiro do Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.

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