Opinião
A evolução para cuidados de saúde inteligentes: «um processo que não será fácil»
Luís Pisco
Presidente do Conselho Diretivo da ARS de Lisboa e Vale do Tejo
As grandes consultoras internacionais publicam com regularidade as suas análises sobre a saúde e as suas perspetivas de evolução a nível global. A Deloitte divulgou recentemente o seu relatório 2018 Global Health Care Outlook - The evolution of smart health care.
Nesta sua perspetiva de 2018 analisa o estado atual do setor da saúde a nível mundial, explora tendências e questões que impactam nos prestadores de serviços, nos governos e noutros financiadores, nos cidadãos, e sugere considerações para as partes interessadas à medida que elas procuram oferecer cuidados de saúde ditos inteligentes, de elevada qualidade e custo-efetivos.
Políticas, processos e capacidades em evolução para prestar cuidados de saúde inteligentes não serão fáceis, dada a magnitude e complexidade dos cuidados de saúde globais. Existirão seguramente obstáculos logísticos e tecnológicos significativos a serem superados. Mais e mais serviços de internamento estão a ser impelidos para ambientes de cuidados não tradicionais, como o internamento domiciliar e os cuidados ambulatórios.
Os prestadores de cuidados de saúde poderão estar a trabalhar muito, mas poderão não estar necessariamente a trabalhar de forma inteligente. Mas o que são considerados cuidados de saúde inteligentes?
• São aqueles em que os tratamentos apropriados são prestados no momento apropriado, no local apropriado, para os doentes apropriados.
• Em que os médicos usam a tecnologia para diagnosticar e tratar com mais precisão as doenças e prestar melhores cuidados.
• Todas as partes interessadas no atendimento ao longo de todo o sistema comunicam e usam informações de forma efetiva e eficiente.
• Os indivíduos corretos fazem o trabalho correto (por exemplo, os enfermeiros cuidam do atendimento aos doentes e não de tarefas administrativas).
• Os doentes são informados e ativamente envolvidos no seu plano de tratamento.
• Novos modelos de prestação com boa relação custo-benefício levam cuidados de saúde a lugares e a pessoas que não os tinham.
• A eficiência melhora e diminui o desperdício.
Individualmente e coletivamente, as partes interessadas em saúde, em 2018, provavelmente enfrentaram uma série de questões existentes e emergentes na sua busca para ficarem mais inteligentes:
• Manter o equilíbrio numa economia de saúde incerta e em mudança.
• Movendo-se estrategicamente de volume para valor.
• Respondendo a políticas de saúde e regulamentos cada vez mais complexos.
• Investir em tecnologias para reduzir custos, aumentar o acesso e melhorar o atendimento.
• Melhorar a experiência dos utilizadores dos serviços.
• Moldar a força de trabalho do futuro.
Os desafios da força de trabalho em saúde estão a ser sentidos em cada vez mais países. A escassez de pessoal é evidente em várias especialidades hospitalares (por exemplo, medicina de emergência e geriatria), mas também nos cuidados ambulatórios. Há, a nível internacional, uma crescente escassez de enfermagem nos cuidados de saúde e de profissionais na área da assistência social.
Para complicar o problema, há falta de liderança estratégica para orientar e apoiar a necessária transformação das organizações de saúde no sentido de serem centradas nos pacientes, no conhecimento e com foco no valor.
A tecnologia digital, a robótica e outras ferramentas automatizadas têm um enorme potencial para resolver pontos problemáticos atuais e futuros da força de trabalho.
Espera-se que a expectativa de vida continue a aumentar, elevando o número de pessoas com mais de 65 anos para mais de 656 milhões, ou seja, 11,5% da população total. A rápida urbanização, o estilo de vida sedentário, a mudança de dieta e o aumento dos níveis de obesidade estão a estimular o aumento das doenças crónicas – mais proeminentemente as doenças neoplásicas, as doenças cardíacas e a diabetes –, mesmo nos países em desenvolvimento.
A China e a Índia têm o maior número de diabéticos no mundo, cerca de 114 milhões e de 69 milhões, respetivamente. Globalmente, o número deverá subir dos atuais 415 para 642 milhões até 2040.
Atualmente, alguém desenvolve demência a cada três segundos e estima-se que 50 milhões de pessoas no mundo vivam com demência - um número que se prevê que dobre a cada 20 anos.
Esta realidade faz com que qualidade, resultados e valor sejam as palavras de ordem dos cuidados de saúde no século XXI. Todas as partes interessadas neste setor em todo o mundo procuram formas inovadoras e eficientes de fornecer cuidados de saúde ditos inteligentes, centrados nas pessoas, apoiados e potenciados pela tecnologia, tanto dentro como fora dos hospitais.
Artigo publico no Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.