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«O medicamento que tomo aos 40 anos não vai ter o mesmo efeito quando eu tiver 70»




“Existe uma lacuna grave na formação médica, tanto na pré como na pós-graduada, nas áreas da Geriatria, da Dor e dos Cuidados Paliativos”, diz Hugo Ribeiro, médico de família, paliativista e coordenador da Iniciativa Médica 3M.

Este projeto, que arrancou em 2018, agrega, atualmente, 10 médicos de sete especialidades diferentes, incluindo quatro de Medicina Geral e Familiar. O objetivo é realizar formação avançada interpares, com uma forte componente prática, "para que mais clínicos tenham conhecimentos sobre estas áreas de saber".

"Todos os médicos devem ter uma noção das necessidades dos idosos"

“Não faz sentido que um médico saia da faculdade e do internato sem ter noção, pelo menos básica, de que o idoso tem particularidades que diferem das do adulto", refere Hugo Ribeiro. E acrescenta: "Que não saiba dar resposta adequada à dor, que é a principal queixa de qualquer especialidade, ou que não consiga identificar precocemente a necessidade de cuidados paliativos."



A ideia de criar a IM3M surgiu quando, após algumas experiências na família e como médico, Hugo Ribeiro resolveu fazer o mestrado de Geriatria na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, sob a direção do internista Manuel Teixeira Veríssimo, presidente do Colégio da Competência em Geriatria da Ordem dos Médicos.

“O Professor é uma referência para mim. Quando estudei Geriatria percebi como é um mundo distinto e é preciso ter médicos que se dediquem apenas a esta área. No entanto, todos os outros devem ter uma noção das particularidades e das necessidades dos idosos”, afirma o médico.

Exemplificando: “O medicamento que tomo aos 40 anos não vai ter o mesmo efeito quando eu tiver 70, porque acontecem alterações farmacodinâmicas e farmacocinéticas extremamente relevantes, relacionadas com a absorção, a distribuição, o metabolismo e a excreção dos fármacos."

Assim, conclui Hugo Ribeiro, "Se não tiver isto em atenção, eventualmente, surgirão reações iatrogénicas que poderiam ser prevenidas.”

“Por ano, 90 mil pessoas precisam de cuidados paliativos diferenciados"

Além do mestrado em Geriatria e de estar a frequentar um doutoramento em Cuidados Paliativos, o coordenador da IM3M tem também uma pós-graduação em Dor. De acordo com o especialista, este empenho na atualização científica e na aquisição de mais competências nestas três áreas justifica-se por ser "muito importante, sobretudo para os doentes”, acrescentando:

“A população está a envelhecer, esta é a principal queixa em todas as especialidades e, por ano, 90 mil pessoas precisam de cuidados paliativos diferenciados. Temos que fazer alguma coisa!”

Em suma, o responsável defende que “é preciso olhar para os grandes problemas da população e preparar os médicos para darem a resposta mais adequada”.

No caso dos cuidados paliativos, nas formações da IM3M faz-se questão de realçar que os cuidados paliativos não se cingem a casos oncológicos e neurodegenerativos terminais, conforme Hugo Ribeiro explica:

 “Há situações de insuficiências de órgão (cardíaca, respiratória, hepática, etc.) ou até osteoartrose avançada, em que o doente fica dependente dos familiares a vários níveis, com as devidas consequências em termos de vida pessoal, familiar e laboral.”



"A dor continua a ser subdiagnosticada e subtratada"


Com especial interesse pela Farmacologia Clínica, pela Farmacocinética e pela Farmacodinâmica, preocupa-o o facto de os conhecimentos serem apenas os básicos quando se sai da faculdade.

“Quando se prescreve, deve-se ter em conta as características individuais, distinguir um fármaco lipossolúvel de um hidrossolúvel, se é excretado via renal ou fecal, se se liga à albumina, qual a fase de biotransformação/ metabolismo… Existem certas noções que nos ajudam a escolher, o que pode trazer mais benefícios e menos riscos.”

Dando um exemplo: “Dentro da mesma classe farmacológica, devo optar por aquele que permite, por exemplo, facilitar a vida a alguém que também é cuidador, que tem uma pessoa dependente de si.”

No caso da dor, Hugo Ribeiro salienta que ainda há algum trabalho a fazer em termos de sensibilização: “A dor é o 5.º sinal vital, mas continua a ser subdiagnosticada e subtratada. Os próprios doentes não mencionam, por vezes, o que sentem, por culturalmente se achar que é uma fatalidade da doença ou do envelhecimento e que se tem de viver assim.”

Mas a verdade é que existe “todo um perfil biopsicossocial da dor que merece especial atenção do médico antes de ser feita a escolha do fármaco”. Mais: “Nestes casos, não há SOS – essa nomenclatura deveria mesmo ser erradicada –, mas um esquema terapêutico, que permita evitar ou minimizar, inclusive, a dor crónica, que afeta 40% da população geral portuguesa e cerca de 75% dos idosos.”

IM3M com formações em formato híbrido

Desde que foi criada, a equipa da IM3M tem conseguido chegar a muitos formandos de diferentes locais do país, sobretudo neste tempo de pandemia. Num futuro pós-pandemia, irá manter as formações presenciais, mas também em formato híbrido.

“É uma forma de chegar a mais locais, mas inevitavelmente que há sessões que têm que ser presenciais, nomeadamente o exame físico – sobretudo no caso da dor –, para além da necessidade de realização de trabalhos de grupo, com discussão de casos clínicos. À distância não existe a mesma interação, com a qual aprendemos imenso”, salienta Hugo Ribeiro.

O responsável faz ainda questão de mencionar: “Não somos apenas formadores, mas também formandos, porque estamos sempre a aprender uns com os outros.”




A entrevista completa pode ser lida no Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.
Jornal distribuído em todas as unidades de cuidados primários do SNS. 
Porque as boas práticas merecem uma ampla partilha entre profissionais!

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