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Prescrever exercício físico para prevenir e controlar doenças crónicas




Desde 2004 que José Themudo Barata tem sob a sua direção o Serviço de Nutrição e Atividade Física do Centro Hospitalar da Cova da Beira – Hospital Pêro da Covilhã.

O objetivo não é apenas ter consultas específicas para a população de risco, com diabetes, hipertensão, dislipidemia ou obesidade, mas também levá-los a frequentar programas de educação para a saúde, nos quais aprendem a praticar exercício físico.  

O médico está satisfeito com o trabalho realizado, mas alerta para a falta de investimento na prevenção e na contratação de técnicos de Educação Física.



Corrida, caminhada, jogos ou ginástica são algumas das atividades praticadas no Complexo Desportivo da Covilhã por utentes acompanhados no Serviço de Nutrição e Atividade Física do Centro Hospitalar Cova da Beira – Hospital Pêro da Covilhã (CHCB-HPC).


O seu diretor, José Themudo Barata, salienta a importância do exercício físico na prevenção e controlo da doença: “Não basta ter uma consulta para mudar hábitos alimentares, é preciso pôr as pessoas a praticar atividade física.”

É com orgulho que fala do trabalho desenvolvido pelo Serviço desde 2004, quando o projeto começou a dar os primeiros passos: “Fui convidado para criar uma disciplina de Nutrição e Atividade Física na Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior (FCS-UBI) e, na altura, surgiu também a vontade, por parte do CHCB-HPC, de ter esta oferta para os seus utentes.”



Passo a passo, com mais ou menos dificuldades, José Themudo Barata passou a ter a disciplina, a consulta e também programas de educação para a saúde, os quais englobam as atividades praticadas no Complexo Desportivo da Covilhã. “Não tem sido fácil, porque em Portugal não se investe o suficiente nestes projetos – considerados pouco rentáveis –, mas não desistimos”, observa.

E é assim, com altos e baixos, que aquele especialista de Medicina Interna se desloca à Covilhã para pôr em prática um projeto que há muito ambicionava. “Infelizmente, escasseiam as ofertas deste tipo de intervenção em saúde no setor público”, indica o também especialista em Medicina Desportiva.

Com as consultas vieram os programas mais práticos no complexo desportivo

No Piso 1 das Consultas Externas do CHCB-HPC José Themudo Barata recebe vários utentes, referenciados por colegas de outras especialidades do hospital ou das unidades de cuidados de saúde primários da região. “Regra geral, são pessoas com excesso de peso e obesidade, tendo, na maioria dos casos, diabetes, hipertensão e dislipidemias”, esclarece.

Mas não só. “Também há doentes com patologia cardíaca, respiratória, com osteartroses, que precisam do nosso apoio.” O médico conta com o apoio da equipa do Serviço de Nutrição do hospital, de um psicólogo e de técnicos de Educação Física. “Não basta fazer-se uma consulta a explicar qual o estilo de vida mais saudável, é preciso mudar comportamentos e, para isso, as pessoas têm de aprender na prática.”

Com a ajuda da Câmara Municipal da Covilhã, foi possível passar a ter disponível o Complexo Desportivo da Covilhã, que fica ao pé do hospital, que “tem relvado, pista de atletismo, ginásio… condições para uma boa prática desportiva”.



A prática de exercício físico insere-se assim nos programas de educação para a saúde que complementam a consulta.

“No consultório não é possível ter o tempo suficiente para transmitir mensagens, além disso, o objetivo é que estas pessoas se tornem autónomas e passem a ter uma boa alimentação e a praticar exercício mesmo depois de frequentarem estas ações”, salienta o médico.

E acrescenta: “A maioria das doenças crónicas deve-se à má alimentação, ao sedentarismo, ao tabagismo. É preciso capacitar os utentes, levá-los a perceber que mudar comportamentos errados só traz benefícios e não tem de ser uma tarefa impossível.”

Excetuando as crianças, os utentes são de diferentes faixas etárias. “O mais novo tinha 15 anos, infelizmente, o estilo de vida pouco saudável afeta todas as idades.” Mas a adesão é positiva. “As pessoas gostam de saber que, além da consulta, também podem praticar desporto.”

O facto de experimentarem melhorias na sua vida com as mudanças que introduzem e de não ficarem apenas pelos ensinos teóricos também ajuda a que continuem a ter uma boa alimentação e a praticar exercício após deixarem os programas.


“Estes utentes estão a aprender a cuidar de si próprios, aliás, a Psicologia identifica diferentes fases para a mudança, existindo indicação de que a pessoa deve estar, pelo menos, no estádio da prontidão contemplativa para a mudança, para se intervir.” Por outras palavras, “se não  existir vontade, não conseguimos fazer nada”.


Falta apostar na prevenção e na contratação de técnicos de Educação Física

José Themudo Barata está satisfeito com o trabalho feito desde 2004, mas reconhece que nem sempre tem sido fácil. “Infelizmente, o Estado não investe neste tipo de projetos que, a médio e longo prazo, trazem mais-valias à população, mas também ao erário público.”

E explica: “A maioria das doenças crónicas e das suas complicações deve-se ao estilo de vida errado. Bastava apostar na mudança de comportamentos para se ter melhor saúde e menos custos com estas patologias preveníveis.” Contudo, como refere, “é uma área que não dá dinheiro”.



O diretor do Serviço de Nutrição e Atividade Física do CHCB-HPC frisa que não está apenas a falar sobre prevenção primária. “Seja qual for o estádio, é sempre importante prevenir.”

A reabilitação também não pode ficar esquecida. “No país, a escassez de oferta na área da Reabilitação Cardíaca é flagrante, apenas 10% das pessoas que precisam deste tipo de intervenção acabam por ter alguma resposta.” Continuando, “a reabilitação é essencial para diminuir a probabilidade de novo problema cardíaco, mas, mesmo assim, não existe investimento, mesmo que estejamos entre os países que apresentam mais problemas deste foro, a nível mundial”.

Mas os problemas não se cingem apenas à prevenção, abrangendo também os recursos humanos e materiais. José Themudo Barata salienta que “um dos principais obstáculos que temos enfrentado no Serviço é a falta de técnicos de Educação Física”.

E explica: “Enquanto, no anterior Governo, existiam programas do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) que permitiam alocar estes técnicos em estágios, conseguíamos ter três programas por ano, com atividades no complexo desportivo. Mas, em 2016, já não cumprimos esse número por falta destes profissionais.”

O responsável considera que o Ministério da Saúde deveria abrir vagas para estes técnicos, já que “são essenciais para darem um acompanhamento personalizado e de qualidade”. Enquanto isso não é uma realidade, José Themudo Barata teve de arranjar uma solução.

“Estabelecemos uma parceria com a Faculdade de Desporto da Universidade da Beira Interior, para evitar o fim destes programas.”

Apesar de a maioria dos utentes que necessitam de aprender a praticar exercício físico ter acesso ao mesmo no complexo desportivo, há as exceções. “Do ponto de vista clínico, todas as pessoas podem e devem praticar alguma atividade, nem que seja caminhar, mas, inevitavelmente, os doentes com artroses graves do joelho precisavam de uma piscina e isso não temos.”

Sensibilizar os doentes, mas também os médicos para a importância da atividade física


A Organização Mundial de Saúde (OMS) há muito que recomenda a aposta numa alimentação saudável, conjugada com a prática de exercício físico. Mas ainda não é fácil prescrever esta receita.

“Passar medicamentos para se fazer a determinados períodos de tempo é simples, prescrever exercício físico é mais complexo”, aponta José Themudo Barata.

O diretor do Serviço critica o facto de nem as faculdades de Medicina estarem a apostar na formação em Nutrição e Atividade Física. “Felizmente, na UBI, já temos esta cadeira, que é anual e obrigatória, lecionada por mim, contando tanto como Cardiologia ou Pneumologia, entre outras”.

Mas a realidade nacional, e até mundial, é diferente. “É uma vergonha que não se tenha mais médicos com conhecimento suficiente para prescrever exercício físico, tendo em conta os benefícios do mesmo, já mais que comprovados cientificamente.”

E acrescenta: “Os médicos de Medicina Geral e Familiar deviam ser os primeiros a fazer esta prescrição, devendo existir uma consulta anual de manutenção da saúde, a fim de orientar e aconselhar os doentes a ter um estilo de vida saudável.”

Para José Themudo Barata, “não basta formação, é preciso sensibilizar os médicos para a importância destas consultas e de saberem mais sobre Medicina Desportiva”.

Mas, apesar das dificuldades, ao longo dos anos, já se notam diferenças. “Há cada vez mais ações formativas e exemplo disso foi a realização da Escola de Medicina Familiar de outono 2016 da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF), na qual se realizou o primeiro Curso de Prescrição do Exercício Físico.”

Olhando para o futuro, José Themudo Barata espera que esta vontade de aprender mais sobre Medicina Desportiva seja uma realidade desde a faculdade e que, na Covilhã, os utentes continuem a correr, a caminhar ou a praticar ginástica, integrados num programa de educação para a saúde, contando com o apoio personalizado de técnicos de Educação Física.


A entrevista completa com José Themudo Barata pode ser consultada em pdf.

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