Anestesiologia tem papel determinante no contexto de Patient Blood Management
Os anestesiologistas acompanham o doente proposto para um procedimento cirúrgico ou de imagiologia de intervenção nos períodos pré, intra e pós-operatório, tendo um papel importante no contexto do programa Patient Blood Management (PBM).
Em entrevista à Just News, a presidente da Sociedade Portuguesa de Anestesiologia (SPA), Rosário Órfão começa por indicar que o objetivo de um programa de gestão de sangue (PBM) é “evitar a administração desnecessária de sangue e derivados, prestando melhores cuidados de saúde ao doente”.
Na sua opinião, é por demais evidente a ligação da Anestesiologia, motivo aliás pelo qual o tema foi debatido no Congresso da SPA, que se realizou este ano.
Rosário Órfão refere que o conceito de PBM no perioperatório representa uma abordagem específica para cada doente, levada a cabo por uma equipa multidisciplinar em três momentos diferentes: no pré-operatório, "com a avaliação atempada e otimização dos doentes", no intraoperatório, "minimizando a hemorragia e realizando uma política transfusional restritiva", e no pós-operatório. "Uma terapêutica sempre guiada por objetivos concretos (goal directed therapy), monitorizada continuamente com testes point of care".
De acordo com a anestesiologista, estas noções são relativamente recentes e ainda não estão suficientemente divulgadas. “É objetivo da Direção a que preside sensibilizar e formar os vários stakeholders, em particular os anestesiologistas, todos precisam de ser mais despertados para estes conceitos e para a importância da sua aplicação”, diz, prosseguindo:
“É necessário que os médicos consigam criar nos hospitais onde trabalham protocolos e algoritmos de atuação entre os vários serviços cirúrgicos e o de Anestesiologia, de modo a que quando é decidida a indicação cirúrgica para um doente este seja enviado atempadamente para a consulta de Anestesiologia”, afirma.
E frisa ser “fundamental que cada hospital tenha um plano bem estruturado e que, depois de o aplicar, o audite periodicamente, alterando-o quando não está de acordo com as necessidades e as características de cada local”.
"O PBM não é só tratar a hemorragia"
“A Anestesiologia é uma especialidade de resposta imediata, mas também de antecipação”, indica a presidente da SPA.
Na sua opinião, “o PBM não é dar sangue, não é só tratar a hemorragia, é também preveni-la, aumentar a tolerância do doente, diminui-la com o produto mais adequado, seja ácido tranexânico, fibrinogénio, complexo protrombínico ou outros, monitorizando atempadamente o doente e tendo uma terapêutica dirigida por objetivos bem definidos adequados a cada doente no contexto específico de cada intervenção ”.
Criação de grupos de trabalho multidisciplinares
Rosário Órfão lembra que há alguns anos foi criado um grupo de anestesiologistas e imunohemoterapeutas que têm refletido sobre o programa PBM. A primeira reunião, onde se abordou a necessidade de existir um programa bem sistematizado, ocorreu em 2012.
A SPA criou, entretanto, vários grupos de trabalho multidisciplinares para elaboração de recomendações e consensos na área da hemorragia perioperatória, hemorragia no trauma, hemorragia em Obstetrícia e hemorragia em Pediatria.
Em 2015, no Congresso Português de Anestesiologia, que teve lugar em Cascais, os grupos da Hemorragia Perioperatória e da Hemorragia no Trauma apresentaram os primeiros resultados do trabalho desenvolvido.
O Grupo de Hemorragia Obstétrica da SPA, que inclui anestesiologistas, obstetras e imunohemoterapeutas dos vários pontos do país, apresentou no Congresso da SPA de 2017, no Porto, e publicou na última edição da Revista da SPA, em março de 2018, as recomendações portuguesas para a abordagem multidisciplinar da hemorragia obstétrica.
“O nosso objetivo é ser o mais abrangente possível e tentar elaborar recomendações por consenso, que consigam ir ao encontro das realidades do país, não só as dos grandes centros, mas dos hospitais todos do país.”