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Rastreio da apneia obstrutiva do sono a utentes obesos: «trabalho pioneiro» na USF Corgo

A Unidade de Saúde Familiar (USF) Corgo, em Vila Real, acaba de concluir a auditoria de um projeto que tem vindo a implementar ao longo dos últimos 2 anos.

Em declarações à Just News, Jaime Ribeiro, principal impulsionador da iniciativa, explica tratar-se de "um trabalho pioneiro de rastreio do risco de síndrome de apneia obstrutiva do sono (SAOS) a todos os utentes com obesidade que frequentam a unidade".


Consulta de enfermagem

Ao longo deste período de tempo, "foram avaliados 1534 utentes obesos, que equivale a 91% dos utentes obesos diagnosticados na nossa unidade, e foram referenciados 683 utentes à consulta do sono". Números que, só por si, "são muito expressivos e reveladores da importância deste trabalho", refere Jaime Ribeiro.

STOP-Bang: utilização de "ferramenta validada"

De acordo com o médico interno de Medicina Geral e Familiar (MGF), esta iniciativa teve como motivação central o facto da SAOS ser "uma patologia altamente subdiagnosticada em Portugal, sabendo-se que o seu fator de risco mais bem documentado é precisamente a obesidade".

Na implementação do projeto foi utilizado o questionário STOP-Bang, "que permite fazer o rastreio do risco de apneia obstrutiva do sono moderada ou grave e que está traduzido para português e validado, quer para o uso em contexto de consulta específica ligada às patologias do sono, quer para o uso em contexto dos cuidados de saúde primários em Portugal".


Consulta médica

Este questionário “consiste em oito questões, que avaliam a presença de sinais e sintomas da patologia, bem como características antropométricas e outras correlacionadas”.

Jaime Ribeiro esclarece ainda como funciona: “As hipóteses de resposta a cada questão são ‘Sim’ e ‘Não’, sendo que cada ‘Sim’ equivale a 1 ponto e cada ‘Não’ a 0 pontos. O somatório permite calcular um score que define a presença de risco da doença (score> =3; quanto maior o valor do score, maior o valor preditivo positivo e a especificidade)”.

Um trabalho "executado por toda a unidade"

O projeto teve o seu início após um "desafio" lançado pela coordenadora da USF Corgo, Benedita Seixas, "para renovar os programas de melhoria contínua da qualidade da unidade". Jaime Ribeiro começou então a dinamizar o projeto, acabando rapidamente por "toda a equipa estar envolvida" no trabalho, desde logo, no preenchimento do questionário:

"O papel dos secretários clínicos passa por contactar os utentes que tenham sido identificados como obesos e que não costumem frequentar a unidade e marcar consulta para este efeito, enquanto os enfermeiros realizam as avaliações antropométricas e educam para hábitos de vida mais saudáveis. Os médicos aplicam o questionário, calculando o score e referenciando sempre que necessário para o hospital."


Benedita Seixas e Jaime Ribeiro

Quanto ao médico e ao enfermeiro de família, Jaime Ribeiro indica que o seu papel passa ainda por tentar atuar no principal fator de risco, que é a obesidade, "promovendo a alimentação saudável e em alguns casos referenciando para a consulta de Nutrição que existe no centro de saúde, além de promoverem a atividade e o exercício físico e de otimizarem o tratamento das patologias correlacionadas, como é o caso da hipertensão".

Para que todos os elementos da equipa da USF Corgo pudessem colaborar neste projeto foi criado um plano de acompanhamento interno e dada formação. “Fazem-se também avaliações periódicas dos resultados, redefinindo-se estratégias sempre que seja importante." 

Jaime Ribeiro faz ainda questão de referir que "outros especialistas também contribuíram ativamente para este projeto, mas que atualmente já não estão na nossa unidade".

Impacto da SAOS

O médico de família revela que "toda a equipa está satisfeita com o projeto" que pode diminuir o impacto da SAOS. “É uma doença que está altamente subdiagnosticada e que condiciona um importante aumento da morbimortalidade relacionada com as patologias cardiovasculares, neurovasculares, distúrbios metabólicos e prejuízo das funções neurocognitivas”, realça.



Estes utentes tendem a apresentar hipersonolência diurna, cansaço ou dificuldade em controlar determinadas comorbilidades, como a hipertensão. Contudo, a SAOS "também tem um impacto negativo em terceiros, por causa de aumentar a probabilidade de se ter acidentes rodoviários e de trabalho”, refere o médico.

Para já ainda não foi estabelecido qualquer protocolo com o hospital de referência, o Centro Hospitalar de Trás-Os-Montes e Alto Douro, o que seria importante. “A confirmação do diagnóstico apenas é possível com a realização de polissonografia, que é realizada no hospital, onde a acessibilidade ainda é limitada, o que leva a que grande parte dos utentes aguarde confirmação do diagnóstico”.

"Um trabalho pioneiro nos cuidados primários"

Recordando que "o modelo de rastreio atual da SAOS, baseado nas queixas do doente, não é eficaz (na literatura estima-se que o subdiagnóstico possa ser cerca de 80%)", Jaime Ribeiro destaca os contornos específicos do trabalho desenvolvido na unidade:

"Apesar deste questionário, que foi validado para os cuidados de saúde primários apenas há pouco tempo (artigo publicado em dezembro de 2017), já ser usado (principalmente a nível hospitalar), o nosso trabalho foi pioneiro na medida em que fez a avaliação sistemática do risco de todos os utentes obesos". 

Afirma que não têm conhecimento "que tenha sido realizado outro trabalho deste género" e sublinha o facto da unidade ter começado a usar a ferramenta nos cuidados de saúde primários "mesmo antes de ter sido formalmente validada neste âmbito (começámos no início de 2017)", reforçando ainda a importância do envolvimento de toda a equipa.

Relativamente ao futuro, "esperamos que este trabalho permita diminuir o elevado subdiagnóstico da apneia obstrutiva do sono e tratar os utentes que apresentam potencial de benefício com o tratamento". É também desejo de toda a equipa que esta experiência "possa eventualmente ser replicada noutras unidades e beneficiar os seus utentes".


USF Corgo: uma equipa que vê a sua unidade reforçada ao redor de mais uma iniciativa motivada pela "necessidade de melhoria contínua da qualidade de prestação de serviços à nossa população"

Criada em 21 de junho de 2011,  a USF Corgo integra o ACES Douro I – Marão e Douro Norte e tem inscritos 13423 utentes, sendo a equipa atualmente constituída por 8 médicos especialistas, 5 médicos internos, 8 enfermeiros e 6 secretários clínicos.

Além do processo sistemático de rastreio da SAOS a utentes obesos, a USF Corgo tem outros projetos em curso, como a Consulta de Pequena Cirurgia, sendo também realizadas, periodicamente, sessões de esclarecimento para os utentes sobre temas específicos, contribuindo para uma melhor literacia em saúde.



Distribuído em todas as unidades de saúde familiar (USF) do país e outras unidades do SNS, Jornal Médico dos Cuidados de Saúde Primários é dirigido a estes profissionais. De periodicidade mensal, promove e incentiva a partilha de boas práticas entre pares, valorizando o SNS e os seus profissionais. 

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