Controlo da infeção: «Todos os hospitais deveriam ter serviços de Epidemiologia clínica»
Alertar a comunidade científica e profissional para a importância da criação de serviços de Epidemiologia hospitalar foi um dos objetivos das I Jornadas de Epidemiologia Hospitalar e Controlo da Infeção, um evento organizado pela Associação Portuguesa de Infeção Hospitalar (APIH) e que decorreu esta quinta-feira.
Para Lúcio Meneses de Almeida, presidente da APIH, não há qualquer dúvida: “Todos os hospitais deveriam dispor de serviços de investigação, Epidemiologia clínica e de Saúde Pública hospitalar”.
Em declarações à Just News, refere que estes serviços de Epidemiologia hospitalar estão previstos desde a publicação do diploma, em 2015, "que estabelece disposições sobre a integração do Serviço de Investigação, Epidemiologia Clínica e de Saúde Pública Hospitalar nos hospitais, centros hospitalares e unidades locais de saúde".
Contudo, “atualmente, existe um único serviço no Centro Hospitalar Universitário de S. João (CHUSJ)". Logo, conclui, "foi um diploma inconsequente".
Papel fundamental no "planeamento dos serviços e dos recursos”
Conforme explica, estes serviços têm várias finalidades, daí a sua relevância. "A Epidemiologia hospitalar está relacionada com o controlo da infeção, com a qualidade e segurança dos cuidados, mas também com planeamento, eficiência e efetividade dos serviços.”
Lúcio Meneses de Almeida
O responsável realça ainda que “os hospitais estão muito vocacionados para a prestação de cuidados com base na capacidade que têm, mas que nem sempre dão resposta às necessidades da população”. Para evitar esse desajustamento, “a Epidemiologia é fundamental, contribuindo para a prevenção e controlo de surtos, mas também para um melhor planeamento dos serviços e dos recursos”.
Com poucas pessoas "é possível fazer-se um bom trabalho"
Questionado sobre as razões que estão por detrás da não aplicação do diploma desde 2015 – exceto no CHUSJ, Lúcio Meneses de Almeida é perentório: “Falta de sensibilização por parte da sociedade e do poder político.” E considera que "a possível solução", além de se continuar a alertar para a relevância da Epidemiologia hospitalar, "é a criação de uma rede de epidemiologistas".
Contudo, para que a mesma seja uma realidade, é preciso ter serviços de Epidemiologia dotados de meios e de recursos humanos diferenciados. E, como frisa, “não é necessário ter muitos recursos, pois com poucas pessoas, de qualidade, e a trabalharem em equipa é possível fazer-se um bom trabalho, porque o controlo da infeção é feito em equipa, numa conjugação de saberes e conhecimentos”.
"A Epidemiologia é essencial"
Estas foram as principais ideias que Lúcio Meneses de Almeida transmitiu também, de forma sumária, na sessão de abertura das I Jornadas de Epidemiologia Hospitalar e Controlo da Infeção.
O arranque do evento, que decorreu esta quinta-feira, contou igualmente com a participação de Mário Durval, delegado de Saúde Pública Regional da Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), e de Anabela Graça, diretora da Escola Superior de Tecnologia da Saúde de Lisboa (ESTeSL).
Mário Durval também enfatizou o papel dos epidemiologistas no controlo da infeção. “A Epidemiologia é essencial, porque se não se conseguir ter uma visão da dinâmica dos microorganismos, certamente não iremos resolver este problema de saúde pública.”
O responsável relembrou, inclusive, que “na natureza do ponto de vista da Microbiologia, não existe o ‘el dorado’ da assepsia, logo a forma como se olha para os microorganismos das várias unidades de saúde é um desafio que se tem de vencer”. O especialista alertou ainda para a importância de ser ter “uma visão global, comunitária, que vá além do microcosmos das unidades”.
Mário Durval, Anabela Graça e Lúcio Meneses de Almeida
Cidadãos devem ser "promotores da saúde coletiva"
Anabela Graça também não deixou de sublinhar que “a infeção hospitalar é uma preocupação de todos e um problema de saúde pública”, daí a sua “necessária e premente resolução e discussão para se encontrar os melhores caminhos”. Como frisou ainda: “As infeções associadas aos cuidados de saúde (IACS) são inaceitáveis, sendo evitáveis através da adoção de determinadas atitudes e comportamentos.”
A diretora das ESTeSL relembrou também que o combate à infeção não se deve cingir aos profissionais de saúde, devendo envolver também os cidadãos, que "não devem ser "meros espetadores, mas promotores da saúde coletiva”.