«As Jornadas Multidisciplinares de MGF nasceram, cresceram, frutificaram e afirmaram-se»

Afirmando que as Jornadas “pretendem ser de todos nós, médicos de MGF”, Paulo Pessanha não deixou de lembrar que se trata de um evento organizado por médicos de MGF para médicos de MGF. E acrescentou: “Têm por objetivo ser uma ação de educação e de formação médica diversificada e interativa, dirigida às reais necessidades formativas de todos nós. Pretendem ser uma troca de ideias, atos e experiências em várias áreas da medicina muito diversificadas.”



Admitindo que “o impacto e a importância” do projeto ultrapassou as expectativas criadas pelos três responsáveis pela sua criação, Paulo Pessanha mostrou a sua satisfação, frisando que “as Jornadas nasceram, cresceram, frutificaram e afirmaram-se”. O número recorde de inscrições registadas este ano provam-no, ultrapassando as três mil, bem acima das 2400 de 2024.

“Esta realidade demonstra o interesse e a necessidade de atualização dos médicos de família no sentido de servir mais e melhor a saúde dos nossos doentes”, disse, para logo a seguir sublinhar que “a especialidade de MGF é a pedra basilar de qualquer Sistema de Saúde”.

“Sem uma MGF forte, com profissionais diferenciados e atualizados, não é de todo possível termos um Sistema de Saúde de qualidade.
Só uma MGF eficaz poderá assegurar uma política de saúde concertada, orientada para o doente, permitindo uma prestação de cuidados de excelência”, afirmou Paulo Pessanha.


Paulo Pessanha

Apelou depois a que os médicos de família sejam “devidamente reconhecidos e acarinhados” e disse ser necessário “facultar-lhes boas condições de trabalho”. Dignificar a carreira, tornando-a atrativa, e dando condições privilegiadas a quem exerce fora dos grandes centros urbanos são aspetos, no seu entender, essenciais.

Paulo Pessanha não deixou de agradecer à Comissão Organizadora das Jornadas, formada por jovens médicos de família que a integram desde a 1.ª edição, a maior parte dos quais, aliás, eram internos da especialidade de MGF nessa altura, em 2019.

“O legado técnico, científico e formativo da MGF pode estar em risco”

Carlos Cortes, bastonário da Ordem dos Médicos, usou da palavra sobretudo para enaltecer “o legado da MGF, que nos ajuda no presente e nos auxilia a olhar para o futuro”, não sem antes fazer referência ao “momento particular que se vive em Portugal, do qual não podemos estar alheios, e que tem um impacto negativo sobre a crise existente no SNS”.


Carlos Cortes


Com base no percurso já vivido, o médico defendeu que “a MGF deve ter muito orgulho naquilo que construiu ao longo dos anos, sobretudo desde a criação do SNS, e no período subsequente, em que a especialidade começou a organizar-se e a desenvolver-se num sistema que difere do de outros países”, prosseguindo:

“A medicina, o SNS e os cuidados de saúde, em Portugal, assentam muito sobre o papel dos CSP e da MGF. O país quis apostar numa medicina que se baseia bastante na prevenção, na promoção e numa estruturação da MGF e da Saúde Pública, e nem todos os países funcionam desta forma.”

A este respeito, partilhou, inclusive, a experiência que viveu muito recentemente numa visita profissional a Paris, onde verificou que “os CSP têm um papel muito residual, mais contido e menos estruturado, o que não é um caminho pior ou melhor, mas diferente. Lá, a MGF está mais reservada à iniciativa privada, o que traz consequências. A medicina em França é essencialmente hospitalar”.

O bastonário da OM adiantou ainda que a média de idade dos médicos de família da cidade de Paris ultrapassa os 60 anos, algo que se deve ao “problema da habitação naquela capital europeia, que se vê assim completamente desfalcada em termos de CSP”.



“Em Portugal, por sua vez, tivemos uma trajetória muito diferente, que vos deve orgulhar, em direção a uma medicina que se quer fundamentalmente assente não numa porta de entrada, que é a MGF, mas sobretudo querendo que a MGF seja o coração a pulsar do SNS”, sublinhou.

Contudo, logo de seguida, lamentou que a aposta política não tenha ido “no sentido da prevenção da doença nem da promoção da saúde, essenciais para o desenvolvimento da medicina”, referindo-se à decisão da generalização da ULS, que lhe tem trazido algumas inquietações:

“As mudanças são importantes, mas há alguns sinais negativos que me preocupam e que devem merecer a vossa atenção. O legado técnico, científico e formativo da MGF pode estar em risco, porque a integração que se pretendia entre cuidados de saúde primários e hospitalares não está verdadeiramente a funcionar.”

Outro aspeto que diz merecer a atenção de todos é a criação das parcerias público-privadas na saúde, alertando que “a aposta não pode ser feita na doença, e a gestão privada, muitas vezes, favorece a doença, pois, é esta que alimenta o seu funcionamento. A gestão dos serviços públicos não pode ser baseada na doença, mas na prevenção”.

Apelou, por isso, os participantes a “não se esquecerem de que o legado vem de trás, mas tem de ser transmitido às futuras gerações, e a preservarem o lugar da MGF no SNS e aquilo que conquistaram ao longo dos anos, porque o mais importante é a medicina hipocrática, a defesa dos doentes e o bem-estar de todos os profissionais de saúde”.


Manuel Viana, Rui Costa, Carlos Cortes, Rui Moreira e Paulo Pessanha

“A relação empática entre os portugueses e os seus médicos de família mantém-se”

Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, começou por referir que “a ligação que os portugueses têm com os médicos de família não é de hoje”, recordando que já no livro “As Pupilas do Senhor Reitor”, de Júlio Dinis, editado em 1867, se encontrava a personagem João Semana, “uma figura simpática, que ajuda os leitores a perceber a influência que, já em pleno século XIX, os médicos de família tinham na sociedade portuguesa”.


E o facto é que “essa relação empática entre os portugueses e os seus médicos de família se mantém, também pela vantagem de poderem ajudar, muitas vezes, na prevenção, evitando que as pessoas tenham que recorrer às urgências”.

Enquanto “utilizador frequente do Sistema Nacional de Saúde”, Rui Moreira fez questão de “salientar o trabalho diário dos médicos” e destacou a importância de “a gestão hospitalar e a gestão da saúde não interferirem com o seu trabalho”. Fundamental é ainda, na sua opinião, “evitar a politização das estruturas, pois, daí resultam impedimentos para a realização do trabalho”, algo que diz verificar regularmente na sua função enquanto presidente de câmara. 


Rui Moreira

Mostrando algumas dúvidas sobre as mais-valias do modelo ULS, encorajou os presentes a “continuar a fazer um bom trabalho”. Numa altura em que “a cidade do Porto está a ter um alto influxo de estrangeiros, representando mais de 10% da população”, Rui Moreira afirmou que “é desse grupo que se recolhe, muitas vezes, o melhor barómetro sobre o trabalho dos CSP, e um dos aspetos referidos é que a Saúde Pública em Portugal é muito melhor do que a dos seus países de origem, e quem o diz são americanos, ingleses, franceses...”

A este propósito, o autarca notou que, “por vezes, não reconhecemos aquilo que fazemos”, por isso, é importante “que guardemos aquilo que temos e que tentemos melhorar”.

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