Falta de autonomia dos hospitais leva, «em última análise, à deterioração dos cuidados de saúde»

A Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) está preocupada com a falta de capacidade de investimento das estruturas hospitalares do Serviço Nacional de Saúde e promete desenvolver todos os esforços para pôr um travão ao que diz ser a “deterioração na prestação de cuidados de saúde”.

Na 2.ª Conferência de Valor APAH, subordinada ao tema “Modelos financeiro e de financiamento – Desafios e oportunidades”, no Porto, Alexandre Lourenço, presidente da associação, disse conhecer as enormes restrições financeiras que os administradores hospitalares enfrentam, principalmente ao nível do capital para investimento e financiamento operacional, sublinhando que é necessário parar o ciclo de deterioração que se tem instalado nos últimos anos.



“Ao nível do capital para financiamento, temos assistido a uma quebra desde 2009 e grande parte dos equipamentos que temos nos nossos hospitais estão em risco de se tornar obsoletos ou ultrapassaram já esse limite”, revelou o dirigente, que por isso classifica como “urgente” a necessidade de encontrar soluções para resolver estes “graves problemas”, sob pena de ocorrer uma deterioração do serviço prestado.

O presidente da APAH admitiu que é real a existência de um conjunto de pressões sobre os custos e que "a falta de autonomia dos hospitais limita a capacidade de ação dos conselhos de administração e a sua missão de gerir os profissionais de saúde".



“O conjunto de restrições que existe ao nível da contratação limita a capacidade dos hospitais em resolver os seus problemas internos, o que leva à frustração dos profissionais de saúde e, em última instância, à deterioração dos cuidados de saúde prestados”, reconheceu Alexandre Lourenço.

"A confiança é o nosso último bastião"

Embora considerando que os administradores hospitalares compreendem os anseios dos profissionais de saúde e as dificuldades que atravessam, salientou que há “linhas vermelhas que não devem ser ultrapassadas”.



“Cabe-nos a nós, administradores hospitalares, defender os direitos dos doentes e a sustentabilidade do sistema de saúde. E essa sustentabilidade depende da confiança que os portugueses têm do serviço que prestamos. A confiança é o nosso último bastião",  alertou o presidente da APAH.

Na sua opinião, "quando esse elo com os portugueses se quebrar, o SNS deixará de existir”, concluindo que é tempo de operar e liderar a mudança do sistema.



Formação "é também uma aposta da tutela"

Presente também nesta 2.ª Conferência de Valor APAH esteve o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, que, perante uma plateia repleta de administradores hospitalares, relevou o trabalho de formação promovido pela APAH e apontou que essa área "é também uma aposta da tutela".


Adalberto Campos Fernandes

“A APAH tem desenvolvido um trabalho de grande vitalidade no campo da formação. É uma aposta da APAH e que o Ministério da Saúde apoia, pois, é preciso que a gestão se qualifique”, frisou o ministro. 

Os sistemas de saúde "não se autorregulam"

A 2.ª Conferência de Valor APAH contou ainda com a participação de vários oradores estrangeiros, com destaque para as comunicações de Rafael Bengoa, ministro da Saúde do País Basco entre 2009 e 2012 e a trabalhar na OMS há 15 anos, e de Miklós Szócska, ex-ministro da Saúde da Hungria.


Gerry O´Dwyer, presidente da Associação Europeia de Gestores Hospitalares, com Rafael Bengoa

O especialista espanhol, hoje diretor do Instituto para a Saúde e Estratégia, sedeado em Bilbao, Espanha, frisou que o atual sistema de saúde “já não é o necessário”, alegando que a realidade mudou e que estamos prestes a enfrentar alterações ainda mais profundas:

“Nos próximos oito anos vamos ter o mesmo nível de mudança que tivemos nos últimos 40. Os sistemas de saúde não estão a acompanhar esse ritmo, não se autorregulam, e se não fizermos alguma coisa vamos obviamente ficar para trás”, declarou Rafael Bengoa, reiterando que a mudança necessária é “urgente” e tem de ser liderada pela classe política.

Envolver os políticos nas mudanças


Miklós Szócska

Também Miklós Szócska realçou a importância dos políticos na mudança que tem de ser operada, trazendo à audiência uma visão apocalítica:

“Ou fazemos a mudança e nos adaptamos, ou o sistema que conhecemos desaparecerá”, vaticinou, deixando aos presidentes dos conselhos de administração presentes a sugestão de envolver a classe política nas mudanças necessárias.


Victor Herdeiro, Vice-presidente da APAH, com Pedro Esteves.

Além destes dois reputados especialistas internacionais, a 2.ª Conferência de Valor APAH, que decorreu nos dias 7 e 8 de julho, contou com a participação de representantes de entidades centrais, da administração hospitalar, do mundo académico e dos agentes económicos. O evento foi presidido por Pedro Esteves, administrador hospitalar atualmente na ARS do Norte. 

A próxima Conferência de Valor realiza-se em Évora, em outubro.


Direção da APAH com o presidente da reunião

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