USF Arco-Íris cuida da saúde mental na Amadora com o apoio de uma equipa hospitalar

Ocupando dois pisos (o 5.º e o 6.º) do n.º 1 do Largo Dr. Dário Gandra Nunes, na Amadora, a USF Arco-Íris partilha o edifício com a UCSP da Amadora e com a Equipa Comunitária de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital Fernando Fonseca. Esta acompanha pessoas com perturbações mentais que podem ser seguidas na comunidade.

A proximidade física entre os profissionais da USF Arco-Íris e os do hospital é, sem dúvida, uma grande mais-valia para todos, em particular para os próprios doentes, os principais beneficiados.

Maior eficácia no acompanhamento dos utentes

Em entrevista à Just News, publicada na última edição do Jornal Médico, o coordenador da USF Arco-Íris afirma que, “em determinadas situações, como nos casos mais urgentes, após a referenciação via Alert para o HFF, podemos contar com o apoio do colega responsável pela equipa, o Dr. José Flores". Esta medida "agiliza todo o processo, permitindo que a consulta seja marcada com a máxima brevidade”.

O contacto direto com a equipa comunitária, que integra dois psiquiatras, duas enfermeiras, uma psicóloga e uma assistente social, permite aos médicos da USF Arco-Íris uma maior eficácia no acompanhamento dos utentes com problemas do foro mental, com destaque óbvio para os casos de depressão, os mais frequentes no âmbito dos cuidados de saúde primários.



A esse propósito, Ricardo Cunha sublinha que “a doença já não está associada, sobretudo, a quem vive mais isolado”.

Nos últimos anos, “registámos um número crescente de casos nas faixas etárias mais novas, principalmente na população ativa, com filhos e que vive, ou viveu, o drama do desemprego e da crise”.



Intervenção precoce para evitar "repercussões na fase adulta”

Para José Flores, “é muito importante que este tipo de resposta esteja disponível nos CSP”. No caso específico da depressão – “em relação à qual os médicos de família têm um papel fundamental” –, relembra que esta e outras doenças mentais “costumam surgir na adolescência, sendo essencial que toda a população esteja atenta aos sinais, principalmente a família e os professores, assim como os próprios profissionais de saúde”.


José Flores.

Nesse sentido, defende que haja uma maior aposta “na sensibilização e na formação nesta área, para se evitar o diagnóstico e o tratamento tardios, com repercussões na fase adulta”.

Apesar de a USF Arco-íris apenas existir desde 2009, é de salientar que a Equipa Comunitária de Psiquiatria e Saúde Mental está presente na região da Amadora há 20 anos, o que não acontece em todas as localidades. “As equipas funcionais na comunidade deviam, perante o flagelo destas patologias, estar mais disseminadas pelo país”, considera José Flores.

Ambiente alegre e acolhedor

Quem entra na USF Arco-Íris tem motivos para sorrir. Em vez de um ambiente mais escuro, típico de unidades funcionais localizadas em prédios, depara-se com muita luz, nas paredes há desenhos de arco-íris, sol, bonecos, as persianas também são coloridas e na sala de espera da Saúde Infantil as crianças podem jogar à macaca.



Pormenores pensados por quem criou esta USF, comenta Ricardo Cunha, que não integrou a equipa desde o início. “Os meus colegas quiseram que as pessoas se sentissem bem, tranquilas enquanto aguardam a sua vez.”

A importância que se deu ao ambiente da USF foi considerado tão importante que, na sala de espera, as cadeiras foram colocadas de forma a que ninguém fique de costas para os monitores, para que possam estar atentos aos vídeos de educação para a saúde que vão passando.


“O mais importante é continuar a ter esta equipa motivada e cheia de dinamismo, porque isso é 50% do segredo para se ter sucesso na prestação de bons cuidados de saúde à população", afirma Ricardo Cunha.

Pouca literacia em saúde e utentes que não falam português

A população é multicultural – além dos portugueses que vivem há 20 ou 30 anos na Amadora, há os imigrantes de Cabo Verde, de São Tomé, do Paquistão, da Índia e do Brasil. “É uma população muito heterogénea, com um nível baixo de literacia em saúde, logo nem sempre é fácil comunicar, nomeadamente com os imigrantes, que têm mais dificuldade em falar a nossa língua”, reconhece Ricardo Cunha.

Uma forma de contornar esta situação é disponibilizando informação noutros idiomas: “Na sala de espera, há painéis em inglês. As informações relativas aos direitos e deveres dos utentes, bem como os consentimentos informados, também estão disponíveis em inglês e em Braille.”



"Vontade de fazer sempre mais e melhor"

Obstáculos que, apesar de tudo, são vistos como desafiantes e motivadores. “A equipa está muito empenhada, sente-se motivada e tem vontade de fazer sempre mais e melhor, por isso, a diversidade de culturas não nos assusta”, afirma.

Ricardo Cunha diz mesmo que gosta de trabalhar neste ambiente: “É bom, porque exige mais de nós, obriga-nos a estudar, a investigar, o que é ótimo em termos profissionais”.

"Enfermeira do Noddy" não vira a cara às situações mais difíceis

Como é habitual nas reportagens publicadas pelo Jornal Médico dos Cuidados de Saúde Primários, são também entrevistados outros profissionais da unidade. É o caso de Ema Resende, enfermeira há 27 anos, que, para atender as crianças, gosta de usar o Noddy, um boneco de pano que coloca no bolso da bata. “Encontrei-o há quase 20 anos, alguma criança o deve ter perdido e desde aí que sou conhecida como a enfermeira do Noddy”, relembra a sorrir.

Com 52 anos, a enfermeira não está nada arrependida da profissão que escolheu e de estar nos cuidados de saúde primários, apesar de nem sempre ser fácil gerir as emoções. “Não nos podemos limitar a tratar a pessoa de forma individual, é necessário conhecer a sua família, o seu ambiente”, refere.

Daí que goste mais do modelo USF do que do formato do centro de saúde antigo.  “Existe uma maior acessibilidade aos cuidados de saúde, as pessoas têm um enfermeiro
de família e já recorrem muitas vezes a nós, antes de irem ao médico”, justifica.



Reconhece que, por vezes, se depara com situações de vida muito duras, sobretudo nos domicílios: “Há idosos e crianças que vivem em péssimas condições, pessoas que secam fraldas descartáveis de idosos com incontinência urinária, crianças de 2 ou 3 meses que já bebem leite de vaca, do pacote, porque as mães ficaram sem poder amamentar, idosos que não veem a sua reforma, que está nas mãos dos filhos…”

Visivelmente emocionada, Ema Resende diz que, apesar das dificuldades, há situações que, após reportadas à Assistência Social, têm um final feliz. Em relação a outras é preciso prolongar as idas a casa, sendo “uma forma de forçar aqueles familiares a estarem mais presentes”.

"Ter voz ativa é uma motivação muito grande"

Com 53 anos, a secretária clínica sempre trabalhou nesta área. “Estava na UCSP Amadora quando me convidaram para integrar esta equipa e aceitei.” Na altura, foi um desafio. “Ainda não se sabia muito bem como funcionava este modelo, mas ainda bem que vim, estou muito satisfeita.”

Manuela Fernandes diz que sente diferenças. “Pessoalmente, sempre me empenhei em aprender coisas novas e em evoluir na carreira, mas, de facto, no modelo antigo via-se muitas colegas que acabavam por estagnar”, observa.



Para si, não é assim difícil trabalhar por objetivos, mesmo que seja mais “exigente e cansativo”. “O resultado final é sempre melhor, quer para nós como para os utentes”, diz.

O facto de o secretário clínico "ter voz ativa é uma motivação muito grande". Nesse sentido, está de acordo que  haja um reconhecimento da carreira de secretária clínica. “Seria uma forma de se ter mais formação nesta área, além disso o futuro é a USF, os mais novos vão entrar neste modelo.”



“É muito gratificante dar apoio a pessoas em dificuldade”

É com determinação que Joana Matos Branco, 28 anos, médica interna do 2.º ano da especialidade de MGF, nos diz que não hesitou em seguir MGF. “Sempre me agradou acompanhar as pessoas desde que nascem até ao final da vida e o enfoque na relação médico-doente.” Um trabalho dinâmico para quem gosta de desafios.

Joana Matos Branco, que é orientada pelo coordenador da USF, diz que optou pela USF Arco-Íris pela organização da mesma e pelo seu excelente ambiente, mas também pela multiculturalidade desta região. “Há muitos imigrantes, diferentes culturas, o que acaba por ser muito enriquecedor”, afirma.

O facto de uma boa parte da população desta região também ser socioeconomicamente desfavorecida – quer seja entre os imigrantes ou os portugueses – também os leva a recorrer mais aos CSP. Para a médica interna, esta realidade é uma mais-valia para a sua carreira futura.


Joana Matos Branco.

De acordo com a médica interna, “não temos um trabalho tão assente em burocracias – como passar uma baixa médica –, havendo uma oportunidade privilegiada para estabelecer uma relação de confiança com as pessoas, no sentido de dar a melhor resposta possível às suas necessidades". E acrescenta: “É muito gratificante saber que estou a dar apoio a pessoas em dificuldade económica e social.”

Quanto ao seu futuro, ainda não está “assustada” com a procura de emprego, mas reconhece que a situação não está fácil, sublinhando que "há uma má distribuição na colocação de médicos de MGF, existindo regiões muito carenciadas, como a Amadora".




A reportagem completa sobre a USF Arco-Íris pode ser lida na edição de junho do Jornal Médico.

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