Enfermeiros da Pedopsiquiatria debatem a saúde mental dos adolescentes com a comunidade escolar

"Existem dados evidentes que a saúde mental dos jovens não é a melhor nesta fase", adverte a enfermeira Filipa Pascoinho, especialista em Saúde Mental e Psiquiatria e elemento do Serviço de Pedopsiquiatria do Hospital Pediátrico de Coimbra.

Em declarações à Just News, adianta que "o número de pedidos de primeiras consultas no nosso serviço aumentou exponencialmente na fase pós-covid" e explica o que poderá estar por detrás desta evolução preocupante:

"Muitos jovens viram as suas condições prévias de saúde mental agravadas durante a fase Covid-19 devido aos confinamentos e agora estão a sentir as repercussões desta fase, por exemplo, problemas relacionados com ansiedade e dificuldade na gestão das emoções, daí o aumento por exemplo dos adolescentes com comportamentos autolesivos."

E acrescenta que, na fase pós-covid, "detetámos também que os casos que nos chegavam, por exemplo anorexias nervosas, foram mais graves que o habitual até então".

É neste contexto, esclarece Filipa Pascoinho, que a equipa que integra decidiu realizar um seminário precisamente dedicado à "saúde mental dos adolescentes". E porque se trata de um problema complexo, consideraram que deveria ser inclusivo.

Assim, a iniciativa, agendada para dia 14 de outubro, é de inscrição gratuita e, além de profissionais de saúde de variadas unidades hospitalares, mas também dos cuidados de saúde primários, vai também reunir a comunidade escolar.

Alguns elementos da equipa de Enfermagem do Serviço de Pedopsiquiatria do Hospital Pediátrico de Coimbra: Filipa Pascoinho, Aida Borges, Liliana Ferreira e Vasco Correia

Sinais de alerta: "Há uma margem de progressão enorme para intervir"

Um dos temas que será abordado na reunião está relacionado com os sinais de alerta da perturbação mental em adolescentes. E, para Filipa Pascoinho, não há qualquer dúvida de que "existe uma margem de progressão enorme" no que diz respeito a uma intervenção mais precoce e uma referenciação mais atempada.

Recorda a enfermeira especialista em Saúde Mental e Psiquiatria que, "até à atualidade, a saúde mental tem sido estigmatizada e por vezes, até alguns sintomas de doença mental desvalorizados pelos pais/professores, sendo encarados como comportamentos típicos da adolescência (por exemplo: isolamento, uso de roupas largas, irritabilidade fácil…)".

Neste sentido, considera que "a Covid-19 veio dar uma maior visibilidade aos problemas de saúde mental, e até algumas figuras públicas acabaram por expor também que tinham sido diagnosticadas com algum problema de saúde mental".

Na sua opinião, esta maior abertura da sociedade em geral para "reconhecer que a saúde mental não pode ser descurada e que também as gerações mais novas podem ter estas perturbações é o ponto de partida para atuar na prevenção e promoção da saúde mental dos adolescentes". E não só. Será também o momento adequado para "atuar também bem na minimização de recaídas em caso de perturbação mental já diagnosticada".

Assim, um dos objetivos do Seminário de “Saúde mental dos adolescentes” é precisamente o de "obter uma melhor literacia em saúde mental nas equipas de cuidados de saúde primários e da comunidade escolar".

O programa completo do Seminário pode ser consultado aqui. A inscrição pode ser efetuada aqui.


A equipa na sua totalidade 


MenteCiente

Dutante o Seminário será também apresentado um projeto do grupo de enfermeiros da Pedopsiquiatria denominado MenteCiente. E qual o seu propósito?

"Queremos envolver e consciencializar a comunidade escolar (adolescentes, pais, professores e auxiliares de ação educativa) sobre a promoção da saúde mental e a prevenção e/ou gestão das perturbações mentais dos adolescentes através da melhoria da literacia em saúde mental, facilitando o acesso, a compreensão e a utilização de informação em saúde mental, baseada numa prática empírica e cientificamente fundamentada."

Segundo Filipa Pascoinho, este projeto pretende abranger os 24 concelhos da zona centro, "encontrar parceiros e favorecer o envolvimento de todos os stakeholders, fazendo acontecer o que entendemos como uma mais-valia na saúde mental desta geração Z da nossa região, dando resposta aos artigos nº26 e nº27 do Decreto-Lei nº113/2021 que estabelece os princípios gerais e as regras da organização e funcionamento dos serviços de saúde mental."

"Favorecer a identificação e intervenção precoces"

Com o MenteCiente, os enfermeiros visam ainda "sensibilizar e informar o público-alvo sobre as questões desenvolvimentais normativas da adolescência e sobre os potenciais desvios e sinais de alerta relativos às alterações emocionais, do pensamento e do comportamento". Faz também parte dos objetivos disponibilizar "estratégias adaptativas e de ajustamento, que permitam prevenir e/ou gerir os possíveis problemas e /ou perturbações mentais dos adolescentes".

Como finalidade última, o projeto pretende "favorecer a identificação e intervenção precoces, tanto em termos de promoção de competências e recursos, como na prevenção das perturbações mentais junto daqueles que evidenciam vulnerabilidades particulares ou sinais de alerta".      


Filipa Pascoinho

Inovar para "evitar reinternamentos e vindas recorrentes ao serviço de urgência"

"A área da saúde mental da infância e da adolescência é uma área bastante específica", recorda Filipa Pascoinho. E dá um exemplo bem claro: "No Serviço de Pedopsiquiatria os pais não permanecem no internamento, contrariamente ao que acontece nos outros serviços de pediatria. Considerando uma média de dias de internamento a rondar os 21 dias, permite que os enfermeiros estabeleçam uma relação privilegiada com os adolescentes."

Essa relação facilita também que seja possível desenvolver com os jovens "diversas intervenções, nomeadamente, as psicoterapêuticas e psicoeducativas como: técnica de resolução de problemas, técnicas de mediação artístico-expressivas, restruturação cognitiva, técnicas de relaxamento, aconselhamento e intervenções promotoras do processo de relação filhos-pais (OE, 2023)".

A equipa trabalha ainda no sentido de promover a "regulação de emoções dos adolescentes, autoestima, resiliência, adesão ao regime terapêutico entre outras intervenções que são essenciais nesta faixa etária".

E o que mais diferencia o trabalho desenvolvido pela equipa de enfermagem da Pedopsiquiatria do CHUC? "Será a nossa capacidade de inovação, sempre em prol do adolescente e da sua família, juntamente com a equipa multidisciplinar, pois, apesar de, dentro das portas do hospital, estarmos fechados, pretendemos sempre ir de encontro às necessidades e contextos dos nossos adolescentes, de forma a promover o seu bem-estar e evitar reinternamentos e vindas recorrentes ao serviço de urgência."

Os estudos desenvolvidos pela equipa têm também resultado em trabalhos que "derivam para apresentações em congressos e formações em diversos contextos". E, como resultado, vários profissionais têm recebido diferentes prémios, seja por projetos de investigação ou melhores comunicações. No entanto, sublinha Filipa Pascoinho, "a nossa melhor conquista é a enorme satisfação que se traduz nos sorrisos dos adolescentes aquando da alta, com o sentimento de ter contribuído de alguma forma para uma melhoria do seu bem-estar".




"Melhorar a saúde mental dos nossos adolescentes"

No total, são 14 os enfermeiros que integram a equipa de enfermagem da Pedopsiquiatria do Hospital Pediátrico de Coimbra: 3 com formação especializada na área de enfermagem de saúde infantil e pediátrica (um em funções de gestão) e 11 enfermeiros com formação especializada em saúde mental e psiquiátrica.


E como pode ser definida a sua missão? Na perspetiva de Filipa Pascoinho, não há dúvida: "Como enfermeiros e cidadãos, é nossa missão ajudar os pais, professores e profissionais de saúde a serem um elo importante na promoção da saúde mental dos adolescentes e na prevenção de complicações quando já há doença mental instalada. Damos diariamente o nosso melhor para melhorar a saúde mental dos nossos adolescentes, pois são eles o nosso futuro."



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