Opinião
«Importa construir o futuro do Hospital Público. De forma participada e agregadora»
Alexandre Lourenço
Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH)
Asilo, hospício, albergaria, confraria e mercearia são alguns dos termos que, ao longo tempo, foram sinónimo de hospital. Numa época em que a hospitalidade e a assistência se confundiam entre si, o hospital da Idade Média é criado com base na preocupação cristã de abrigar os enfermos necessitados e desamparados.
Essencialmente, com uma vocação assistencial, ao passo que o tratamento médico era secundário, ou até inexistente. Dos primeiros registos no nosso país, surge, por exemplo, o Hospital e Albergaria de Milreu, em Coimbra (1093).
É já no final do séc. XV que D. João II, quando ainda príncipe herdeiro, procura construir o Hospital de Todos os Santos para reunir os rendimentos de diversos pequenos hospitais de Lisboa, a fim de construir um “grande hospital” destinado à assistência de pobres e enfermos.
Até pelo menos à Segunda Guerra, mais tarde em Portugal, os nobres e os burgueses eram tratados nas suas residências, mas os indigentes, os incapazes ou os desvalidos recebiam abrigo e tratamento gratuito nessas instituições, que mantidas por organizações de caridade.
O hospital moderno é fruto da diferenciação e do desenvolvimento tecnológico da segunda metade do século XX. O hospital deixa de ter esse caráter exclusivamente assistencial e passou a simbolizar a reunião de todos os recursos tecnológicos para o tratamento de enfermos de qualquer classe social.
Desde essa altura, o modelo de hospital tem evoluído incrementalmente e foi ocupando um espaço cada vez mais relevante nas nossas vidas. Deixámos as nossas casas e passámos a nascer e a morrer no hospital. As alegrias e as mais profundas mágoas estão associadas ao hospital. Vivemos mais... e mais tempo dedicamos ao hospital. Ele mudou e prolongou as nossas vidas.
Alexandre Lourenço
Paradoxalmente, o hospital foi-se afastando cada vez mais da sua matriz original. Ao longo do tempo, o aumento da diferenciação tornou cada vez mais difícil garantir a proximidade às comunidades e a integração de cuidados.
Antes da pandemia, os desafios do hospital eram já enormes. O hospital conhecia já este dilema da diferenciação-integração. A pandemia veio demonstrar as nossas forças, mas também a nossa fragilidade. Não eliminou nenhum desafio e criou outros.
Neste tempo novo, importa construir o futuro do Hospital Público. De forma participada e agregadora. É isso que a Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares se propõe através da 9.ª edição das Conferências de Valor APAH: reconhecer a inovação tecnológica, a transformação digital, o valor dos profissionais de saúde e o imperativo da integração de cuidados saúde-ação social.
Nós sabemos a razão de ser do Hospital Público. O futuro do Hospital Público são as pessoas. O futuro do Hospital Público somos nós.
Artigo publicado no jornal Hospital Público de abril/maio.