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Gestão mais eficiente do sangue permitiria poupança de 67,7 milhões de euros no SNS

A implementação, a nível nacional, de um programa de Patient Blood Management (PBM), que preconiza uma gestão mais eficiente da utilização do sangue, preservando as reservas dos indivíduos, pode permitir uma poupança de 67,7 milhões de euros para o SNS, concluiu um estudo promovido pelo Anemia Working Group Portugal (AWGP), com a execução técnica e científica da Exigo Consultores.

Há evidência científica que mostra que, em muitas situações, a anemia e a perda de sangue podem ser tratadas com procedimentos médicos ou cirúrgicos que permitem utilizar o sangue de forma mais eficiente, conduzindo a uma redução significativa das transfusões de sangue. Esta é a filosofia de um programa de Patient Blood Management.

Segundo o coordenador do referido estudo, Jorge Félix, diretor da Exigo Consultores, perante estes dados, o objetivo foi “determinar o valor social e económico de implementar, no país, um programa de PBM”. Os resultados foram já apresentados a nível internacional, no congresso da Network for Advancements of Transfusion Alternatives (NATA), em Florença, e na reunião da American Association of Blood Banks, nos EUA.

Um dos primeiros passos deste estudo, pioneiro a nível mundial, foi definir a população portuguesa que tem problemas de anemia e de perdas de sangue que pode vir a ser alvo de um programa de PBM, tendo-se definido, em seguida, um conjunto de indicadores (de utilização do sangue, de saúde pública, de utilização de recursos da saúde e económicos).

Após a colheita de dados, na qual colaboram estruturas de saúde pública como a Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), o Instituto Português do Sangue e Transplantação (IPST) e cerca de duas dezenas de hospitais do país, concluiu-se que um programa de PBM poderá abarcar, por um lado, situações agudas (cirurgia cardíaca, cirurgia ortopédica, cirurgia urológica, gravidez, hemorragia gastrintestinal, hemorragia uterina anómala) e crónicas (oncologia, cardiologia, hemodiálise, doença inflamatória intestinal).

Inferiu-se que, por ano, poderiam ser incluídos num programa com estas características 384.704 indivíduos, os quais são responsáveis por cerca de um terço das transfusões realizadas no país.

Outra das conclusões foi que, com a implementação de um programa de PBM, seria possível reduzir em 57,3% o número de unidades de eritrócitos utilizados nestes indivíduos. Ou seja, a população elegível para um programa nacional de PBM, que utiliza por ano 113.892 unidades de eritrócitos, no futuro, poderia usar cerca de 48.678.

“Em média, uma transfusão em Portugal custa na ordem dos 1200-1300 euros, porque os doentes fazem entre duas a três unidades de eritrócitos que, por si só, são onerosas (custo unitário acima dos 120 euros). A este valor acrescem os custos com a manutenção do sangue, com as pessoas que têm de estar disponíveis para fazer a administração da transfusão, bem como com o período de observação que o doente tem de ter”, aponta.




Por outro lado, lembra, “uma unidade de eritrócitos tem uma validade reduzida, o que significa que se não for utilizada numa janela temporal curta tem de ser deitado fora, porque perde as suas características”.

Há, ainda, “evidências muito robustas”, quer em Portugal, quer noutros países, de que alguém que seja transfundido está sujeito a um risco
de morte acrescido, ou seja, “é mais provável que um indivíduo que esteja hospitalizado, se for transfundido, versus um que não o foi com as mesmas condições, venha a morrer, quer num curto termo, quer num médio termo”.

Por sua vez, estimou-se que será possível reduzir em 51% as transfusões no grupo de indivíduos abrangidos pelo PBM.

Poupança é superior à despesa

O estudo previu uma redução de 10,3% na duração do internamento hospitalar e de 37,2% na taxa de reinternamento, o que, em termos de custos, representaria uma poupança de 70,4 milhões de euros nos custos com hospitalização (53,8 milhões com internamento mais 16,6 milhões com reinternamentos).

“Sabe-se que as transfusões estão associadas a uma maior duração do internamento, o que implica não só mais morbilidade para o doente como também mais custos, porque, por cada dia a mais que o doente passa no hospital, esses custos aumentam em várias centenas de euros”.

De acordo com Jorge Félix, diminuindo a duração do internamento através da implementação de um programa de PBM, estimou-se que seria possível evitar, por ano, a ocorrência
de 594 mortes prematuras – o equivalente a qualquer coisa como cerca de 1500 anos de vida, que assim
são perdidos prematuramente – e, com isso, ganhar tempo de vida.

Estimou-se, ainda, que, por cada ano de implementação do PBM em Portugal, é possível ganhar 3660 DAILY (disability-adjusted life years – anos de vida ajustado pela incapacidade).

Peritos refletem sobre abordagens prioritárias num programa de PBM

Após a conclusão do estudo, um grupo de peritos provenientes de vários pontos do país foi convidado a pronunciar-se sobre quais seriam as abordagens prioritárias num programa de PBM nacional, tendo distinguido duas que consideraram ser mais propensas a resultados: a correção da anemia ferropénica e a implementação de políticas mais restritivas de utilização de sangue, ao nível dos hospitais.



O nosso entrevistado destaca que, no caso das cirurgias programadas, como, por exemplo, da anca ou do joelho, há procedimentos simples, como efetuar um teste atempado ao indivíduo que vai ser intervencionado para avaliar se tem anemia, problema que afeta cerca de 20% da população portuguesa.

“Se um indivíduo entrar no bloco operatório e for anémico, a probabilidade de vir a necessitar de uma transfusão sanguínea durante a operação aumenta exponencialmente. Avulta, também, o risco de morte, o consumo de recursos e a duração do internamento”, menciona, salientando que, se for detetada uma anemia um mês antes, a situação poderá ser corrigida até à cirurgia (por exemplo, através de administração de ferro, se a causa for défice de ferro) e, desta forma, o desfecho final será melhor.

“Em Portugal, historicamente, tem havido escassez de sangue e dos seus componentes. Qualquer medida implementada que possa vir a trazer racionalidade na sua utilização é sempre bem-vinda”, acrescenta Jorge Félix, realçando que, para a maior parte dos hospitais, a rubrica do sangue tem um peso muito elevado.




A notícia completa pode ser lida na edição de fevereiro do Hospital Público.

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