Médicos de Família lançam Podcast «enquadrado no contexto do SNS»

"Conversas sobre literatura médica, simples, pragmáticas e independentes, com episódios quinzenais em que discutimos a prática clínica actual". É desta forma que, sucintamente, David Rodrigues descreve o projeto de Podcast em português recentemente lançado, juntamente com Daniel Pinto. 


Os dois médicos de família da ARS de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT), igualmente assistentes convidados do Departamento de Medicina Geral e Familiar da NOVA Medical School | Faculdade de Ciências Médicas, decidiram, ao fim de vários anos, lançar "Evidentia Médica" e estimular uma discussão "sobre as últimas novidades que a investigação clínica nos oferece".

Lançamento no Encontro de MGF

A apresentação oficial do projeto teve lugar há dias, no decorrer do 35.º Encontro Nacional de Medicina Geral e Familiar (MGF), em Vilamoura. Em declarações à Just News, David Rodrigues, médico de família na USF Santa Cruz (Torres Vedras), refere que "a reação foi excelente e bem acima das expectativas".

E adianta: "Ainda não tínhamos chegado às 48 horas do lançamento e já tínhamos mais de 1000 pessoas a visitar a página e os dois episódios tinham mais de 250 reproduções cada um. Entre nós, a conversa era:´bem, deixa ver se conseguimos ter 50 reproduções na primeira semana´".


David Rodrigues durante o 35.º Encontro de MGF, onde deu a conhecer o projeto

Reconhece que, naturalmente, alguns médicos estarão mais familiarizados que outros com o conceito de Podcast: "Apostamos estar em muitas plataformas e na simplicidade na interacção justamente a pensar nos colegas menos familiarizados com estes conceitos. Estamos na grande maioria das aplicações móveis de podcasts, android e iOS e, por isso, na nossa página temos os episódios à distância de um click."

O docente e investigador faz questão de destacar a sua paixão pela rádio, "porque é algo que facilmente nos acompanha em várias atividades". E, assim, o aparecimento da internet e dos smartphones "tornou os podcasts um complemento natural desse conceito. Continuo a ouvir muita rádio mas os podcasts permitem-me ouvir as últimas novidades sobre temas que me interessam quando e onde quero."

Enquanto atualização de conteúdos médicos, afirma: "São um formato que utilizo há muitos anos, habitualmente nas pequenas viagens de carro que faço para o trabalho e para a faculdade ou enquanto faço exercício físico. Suponho que outros colegas encontrem a mesma utilidade."



Próximo episódio: Cancro da Próstata


Depois de lançados dois episódios este mês, intitulados "Quem somos e o que vamos fazer" e "Medicina Baseada em Ciência, com exceção da Astrofísica e Física Quântica", está já previsto para os próximos dias a discussão de um novo tema:

"No último fim de semana analisámos um artigo publicado na revista JAMA, a 6 de março de 2018, que nos descreve um ensaio clínico sobre rastreio do cancro da próstata com PSA realizado em homens de 50 a 69 anos no Reino Unido durante 10 anos."

Segundo David Rodrigues, "é um ensaio clínico que se juntará a outros dois grandes estudos realizados nesta matéria durante os anos 90, mas desta feita o rastreio consiste em apenas uma medição do PSA (e não várias medições seriadas como nos outros estudos), tentando com isso avaliar o impacto desse rastreio na mortalidade específica por cancro da próstata." 

"Faz-se um ligeiro corte e costura..."

Quanto à dinâmica da construção dos episódios, "demora mais tempo a preparar e editar que a gravar", refere o médico de família. O diretor de Internato Médico de Medicina Geral e Familiar da ARSLVT (responsável pelo ACES Oeste Sul) esclarece:

"Primeiro decidimos o tema e qual o artigo ou os artigos a analisar. Depois cada um de forma independente analisa numa grelha de avaliação de artigos que temos vindo a construir nos cursos que fazemos na faculdade. Decidimos os tópicos que queremos abordar, combinamos o dia, reunimos via Skype e metemos a gravar a conversa que tentamos que seja descontraída."

 
Em plena produção de novo episódio de "Evidentia Médica"

Antes ainda de dar por terminado o episódio, "faz-se um ligeiro corte e costura nalguma parte em que o microfone cai para o lado, algum de nós cai da cadeira, o telefone toca, os filhos entram pelo escritório adentro aos gritos, gaguejamos, enfim, esse tipo de coisas...  e temos o episódio." 

Aliada à evidência médica partilhada, esta boa disposição dos dois fundadores do projeto "Evidentia Médica" destaca-se nos episódios já disponíveis, algo considerado mesmo "inevitável" por David Rodrigues: "Pessoalmente não resisto a uma boa gargalhada e, além disso, acreditamos que ambientes descontraídos, alegres e optimistas são mais propícios a uma boa aprendizagem".

Pouco tempo disponível: "Um sinal de empenho"

"Evidentia Médica" é um projeto que David Rodrigues e Daniel Pinto assumem que gostariam de ter lançado há já uns anos, "quando eram ainda médicos internos". Contudo, só agora, ainda com menos tempo disponível, é que a ideia se concretizou. É um sinal do nível de empenho no projeto?

Segundo David Rodrigues, "é sinal que chegámos à conclusão que nunca iremos ter tempo disponível pelo que o melhor é avançar. Portanto escolhemos uma altura em que o Daniel tem estado a preparar a defesa da tese de doutoramento e eu a meio caminho do mesmo para avançar."



"Ainda que pareça irracional (provavelmente porque é mesmo) a verdade é que há trabalho de casa a ser feito há muito tempo. A metodologia de analisar artigos tem vindo a ser aperfeiçoada com os cursos de avaliação crítica de literatura médica que temos feito ao longo dos anos e ambos mantemos aquilo que a literatura chama um PLE (personal learning environment) com fontes de informação médica organizadas e depuradas ao longo dos anos."

Ou seja, "o material está lá e o método também, pelo que faltava o outro lado que ambos temos. que é o interesse na divulgação científica."

Concluindo, afirma: "Sim, é sinal de empenho. É sinal que sentimos que podemos ser úteis e que nos faz sentido. E de certa forma sentimos que é uma forma de aproveitar as horas que dedicamos a escolher e sintetizar evidência para o nosso dia a dia como médicos."

Investigação Clínica: Prescrição de medicamentos 

Daniel Pinto, médico de família na USF S. Julião, em Oeiras, assume atualmente a coordenação do Internato Médico de Medicina Geral e Familiar da ARS de Lisboa e Vale do Tejo e, à semelhança de David Rodrigues, é assistente convidado do Departamento de MGF da NOVA Medical School|FCM. 


Daniel Pinto e David Rodrigues, durante a gravação do terceiro episódio, a ser lançado muito em breve

De referir que, exatamente esta terça-feira, 27 de março, defendeu, com sucesso, a sua prova de Doutoramento, na especialidade de Investigação Clínica, intitulada: "Factores modificadores do comportamento de prescrição de medicamentos em cuidados primários". António Vaz Carneiro, na qualidade de 1.º arguente do Júri, destacou mesmo existirem "muito poucos estudos com esta qualidade feitos em Portugal".

"A aposta em Podcasts é cada vez maior"

Apesar de não ser ainda muito comum a criação de Podcasts no âmbito da Medicina em Portugal, "curiosamente este ano já temos dois", recorda David Rodrigues, referindo-se ao portal MGFamiliar e, em tom de brincadeira, afirma: "Temos de combinar para não analisar os mesmos artigos".

Sublinhando a importância de "começarem a aparecer novas formas de estimular a literacia científica e de disseminar conteúdos médicos de valor", o médico de família da USF Santa Cruz destaca, em concreto, a "forma muito amigável de podermos ouvir os conteúdos quando e onde queremos. Vemos que a aposta em podcasts é cada vez maior."


Adaptar recomendações e "enquadrar o projecto no contexto do SNS"


Questionado sobre qual o principal elemento diferenciador do projeto, David Rodrigues não hesita, começando por afirmar que "as decisões em saúde devem ter em conta os valores e preferências dos doentes e a experiência do clínico que deve saber integrar a informação mais recente que nos chega da investigação clínica, mas também saber gerir entre outras coisas os recursos que tem à sua disposição."

Nesse sentido, assegura: "Temos a preocupação de enquadrar o projecto no contexto do SNS porque é isso mesmo que a Medicina Baseada em Ciência (ou evidência para ir de encontro à expressão inglesa) defende: integrar o novo conhecimento na prática e contexto real para doentes reais."

Considera mesmo ser esse "o lado mais rico da discussão da evidência"e explica porquê: "Só quem está no terreno consegue avaliar a exequibilidade de determinada recomendação. O nosso contexto e a nossa realidade podem não ser os contextos e a realidade dos países onde boa parte da evidência é produzida, pelo que existirá sempre essa necessidade de adaptar as recomendações aos nossos recursos."

Convite para "interagir connosco"

David Rodrigues faz ainda questão de agradecer "a uma estrelinha ascendente na medicina portuguesa, a dra. Catarina Viegas Dias, por nos ´emprestar` a voz na introdução e final dos episódios". E deixa o convite "para visitarem a página evidentiamedica.com, ouvirem o podcast, interagir connosco com comentários, dúvidas, discussão. É o nosso contributo para uma MGF com mais orgulho e alegria!". O projeto está igualmente acessível no facebook.



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