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Opinião

«A depressão e a ansiedade perinatal constituem um grave problema de saúde pública»


Ana Telma Pereira

Psicóloga. Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) - Instituto de Psicologia Médica.



O período perinatal (gravidez e doze meses após o parto), devido a uma combinação única de stressores neuro-hormonais e psicossociais, aumenta a vulnerabilidade das mulheres para depressão e ansiedade.

Estas são as perturbações mentais mais comuns no período perinatal (Pereira et al. 2019a) e a sua prevalência e comorbilidade (mais de metade dos casos) são ainda mais elevadas do que noutros períodos da vida da mulher (Xavier et al. 2019).

Utilizando as versões para a gravidez e o pós-parto da Diagnostic Interview for Psychological Distress (DIPD; Pereira et al. 2017), no Instituto de Psicologia Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) estimámos a prevalência da depressão major/DSM-5 no período perinatal entre 4% (gravidez) e 8% (pós-parto).

A ansiedade perinatal, apesar de só recentemente ter começado a ser valorizada, é tão ou mais prevalente. Com efeito, nos nossos estudos epidemiológicos, atinge cerca de 7% das mulheres no período perinatal, com claro predomínio da perturbação de ansiedade generalizada.

Se considerarmos as percentagens de mulheres com sofrimento clinicamente relevante devido a estas perturbações psicológicas (com pontuações acima dos pontos de corte em questionários de rastreio validados), estas triplicam, chegando aos 20-25% (Pereira et al. 2018).

Estes resultados são coincidentes com os apresentados na mais robusta investigação internacional (e.g. Falah-Hassani et al. 2016; Fairbrother et al. 2016). Devido não apenas à elevada prevalência, mas também à subdeteção, estigma e impacto negativo em toda a família, a perturbação psicológica perinatal (PPP/depressão e ansiedade) é um grave problema de saúde pública, que, segundo a Associação Mundial de Psiquiatria e a Marcé Society, justifica rastreio e prevenção sistemáticos (Pereira et al. 2016).



No Instituto de Psicologia Médica da FMUC validámos instrumentos de rastreio da depressão e ansiedade, desenvolvidos especificamente para o período perinatal. Isto é importante, pois, o contexto da gravidez e do pós-parto influencia o conteúdo de processos cognitivos como a preocupação e a ruminação, que moldam a manifestação dos sintomas e exigem adaptações no modo como são avaliados (Pereira et al. 2014).

Os nossos estudos psicométricos e operativos têm revelado que a Escala de Rastreio da Depressão Perinatal/Pós-parto (Pereira et al. 2013) e a Escala de Rastreio da Ansiedade Perinatal (Pereira et al. 2019b) têm boa validade, fidelidade e acuidade (com sensibilidade e especificidade > 90%).

Para além da sua utilidade nos cuidados de saúde primários, estes instrumentos têm-nos permitido avançar na investigação da PPP. Confirmámos que a sua etiologia é multidimensional e que inclui correlatos e fatores de risco fixos e potencialmente modificáveis.

Ao compreendermos as potenciais vias de influência entre variáveis sociodemográficas, obstétricas, psicossociais, da história clínica, dos traços de personalidade e dos processos de regulação emocional, vamos obtendo pistas para a melhoria da sua prevenção e intervenção precoce, a implementar desde logo na gravidez, que é quando têm início cerca de metade dos casos de PPP.



O artigo pode ser lido na edição de maio/junho do Hospital Público - jornal para profissionais de saúde, distribuído nos serviços e departamentos de todas as unidades hospitalares do SNS. 
 

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