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Opinião

«A dor crónica, pelas suas consequências, deverá ser vista como uma doença em si mesma»


Tânia Varela

Coordenadora da Equipa Comunitária de Suporte em Cuidados Paliativos de Cascais - ACES Cascais



Desde 2003 que a dor é considerada pela DGS como o 5.º sinal vital, contudo, existem inúmeros doentes que recorrem aos serviços de saúde a quem nunca é questionado se têm ou não dor.


São os doentes mais vulneráveis e com maior dificuldade em comunicar aqueles que maior risco correm de entrar e sair de um serviço de saúde sem nunca lhes ser questionado este sinal vital. Apesar de ser de elevada importância para os doentes, é sistematicamente subavaliado e subvalorizado pelos profissionais de saúde.

Vários são os episódios em que os profissionais consideram que os doentes podem estar a exagerar ou que a dor será apenas durante uns minutos e que por esse motivo não se justifica a realização de analgesia.

Quantas salas de tratamento das nossas USF/ UCSCP dispõem de protocolos analgésicos para a realização de pensos ou outros procedimentos que possam infligir dor aos doentes? Talvez seja importante questionarmo-nos se ao realizar alguns procedimentos sem analgesia estamos realmente a respeitar o princípio da não maleficência?

A dor é uma “experiência sensorial e emocional desagradável associada a dano tecidual, real ou potencial, ou descrita em tais termos”(1). A perceção da dor envolve o estímulo doloroso e a reação emocional à dor, sendo uma experiência pessoal e subjetiva, com uma caracterização multidimensional, modificada por variáveis afetivoemocionais.

É importante distinguir com precisão a dor aguda da dor crónica. A primeira tem curta duração, é um sintoma que contribui para a proteção, alerta o corpo para uma alteração, sinaliza a lesão tecidular, o seu aparecimento é previsível, tem uma causa identificável e desaparece quando a causa é tratada.


Tânia Varela

Já a dor crónica persiste após um período estimado para uma recuperação tecidual normal, aproximadamente 3 meses, perde a sua função de proteção e alerta. Pelas suas consequências, deverá ser vista como uma doença em si mesma.

Está separada do evento que a causou e a sua intensidade já não se relaciona com o mesmo. Desencadeia uma resposta continuada de stress num corpo vulnerável que provoca sofrimento, incapacidade física, funcional e psíquica, cansaço, diminuição do apetite, dificuldade de concentração, alterações de sono, que inevitavelmente levam a um isolamento social, desesperança e sentimento de morte(2).

A dor crónica é um problema de saúde pública, sendo a sua prevalência em Portugal de 36,7%. Em 14% dos portugueses, essa dor é recorrente com intensidade moderada a intensa(3).

Os custos associados à dor crónica ascendem a 4610 milhões de euros/ano, representando 2,7% do PIB nacional (4). A prevalência da dor provoca reformas antecipadas por invalidez, elevado grau de absentismo laboral e desemprego.
 
A promoção do conforto e da dignidade do doente são obrigações éticas de qualquer profissional de saúde. Os cuidados devem ter o doente no centro, sendo a empatia, no momento de cuidar, fundamental, relembrando em todos os momentos que a dor não tem de fazer parte da vida.

Referências:
1. IASP - Definitions of Chronic Pain Syndromes.
2. Barbosa A., Pina R P., Tavares F., Neto GI., Manual de Cuidados Paliativos, 3.ª edição, Centro de Bioética Faculdade de Medicina Universidade de Lisboa, 2016.
3. Azevedo LF et al. J. Epidemiology of Chronic Pain: A Population-Based Nationwide Study on Its Prevalence, Characteristics and Associated Disability in Portugal. The Journal of
Pain. Vol 13 (2012) 773-783.
4. Dor Crónica Portugal – Portugal – Estudo de Prevalência e Impacto Individual, social e económico. Faculdade de Medicina do Porto – março 2011; Observatório Português de Sistemas de Saúde.



Artigo publicado na edição de junho do Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.

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