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«A importância do estado nutricional na cicatrização das feridas»


Filipa Azevedo

Nutricionista. Coordenadora do Programa Vida Saudável Auchan. Membro da Ordem dos Nutricionistas n.º 1914N filipalaborinho.azevedo@auchan.pt



O estado nutricional tem influência na prevenção de várias patologias, recuperação de pós-cirúrgico, processos inflamatórios e cicatrização, sendo que a malnutrição influencia negativamente o processo de recuperação e aumenta o tempo de internamento.

Em contexto hospitalar, doentes desnutridos têm mais probabilidade de desenvolver infeções pós-cirúrgicas e têm um risco maior de morbilidades e morte. Os doentes internados e imobilizados, e principalmente os mais idosos, apresentam muitas vezes risco de desnutrição e também risco de desenvolver feridas crónicas (como úlcera de pressão).

O processo de cicatrização de uma ferida, a reparação e construção de tecidos, é um processo catabólico, que leva ao aumento das necessidades energéticas e nutricionais. Normalmente, estes substratos energéticos são fornecidos pelas reservas do organismo.

Sabe-se que a proteína e alguns aminoácidos são os principais substratos presentes neste processo, então quando existe uma desnutrição proteico-energética (a mais comum em indivíduos com feridas), que se caracteriza por uma diminuição da massa magra, o processo de cicatrização pode ser comprometido.


Filipa Azevedo

Quando existe depleção de proteína há um prolongamento no processo de cicatrização, a proteína para além de um papel enquanto substrato tem também o papel de mediador inflamatório. (Verifica-se um atraso no tempo da fase inflamatória, inibição da proliferação fibroblástica e da angiogénese, diminuição da síntese e deposição de colagénio e proteoglicanos, redução da força tênsil da ferida, condicionamento da capacidade fagocítica dos leucócitos, diminuição da resposta imune e inibição da remodelação da ferida).

Um aporte energético insuficiente causa perda de proteína, pois, esta será utilizada como substrato energético, conduzindo à perda de massa magra; por sua vez, a diminuição de massa magra vai requerer mais proteína para repor esta perda.


Numa perda de massa magra inferior a 10%, a ferida tem prioridade sobre o substrato proteico disponível, à medida que a massa magra diminui, a proteína será utilizada para restaurar perda de massa magra, com menos disponibilidade para a ferida. Perdas de massa magra superiores a 30% conduzem ao desenvolvimento de feridas espontâneas pela fragilização da pele e perda de colagénio.

Estão também implicados no processo de cicatrização aminoácidos como a arginina e a glutamina. A arginina é sintetizada no nosso organismo, no entanto, pode tornar-se essencial em situações de stress ou ferida. A arginina está envolvida na síntese proteica, é precursora do aminoácido prolina na síntese de colagénio e tem a capacidade de produzir hormonas que medeiam mecanismos de cicatrização e estimulação da resposta imunitária.

Segundo alguns estudos, a suplementação com arginina diminui a perda de massa muscular, melhora a síntese de colagénio e deposição do mesmo, melhora a resposta imunitária e estimula a secreção de hormonas anabólicas, a suplementação neste aminoácido apresenta vários benefícios para o processo de cicatrização.

A glutamina tem um papel importante na estimulação da resposta imunitária e na cicatrização, tem propriedades anabólicas e anticatabólicas e a sua suplementação parece melhorar a síntese proteica e está relacionada com diminuição do número de dias de internamento hospitalar.

Para além da proteína e aminoácidos, também os micronutrientes, zinco, selénio, vitamina A, E e C são fundamentais para o processo de cicatrização pois atuam como cofatores que participam nas várias fases da síntese de colagénio. Estudos demonstraram que suplementação nestes micronutrientes e proteína e arginina levaram a uma diminuição do tempo de cicatrização.

O papel de um adequado aporte nutricional, especificamente de proteína, na prevenção e tratamento de feridas é evidente. Em Portugal, segundo dados de 2015 do Nutrition Day, 46% dos indivíduos hospitalizados encontravam-se em risco nutricional, apresentando perda de peso não intencional nos últimos três meses.

É por isso essencial um diagnóstico nutricional para verificar se há necessidade de suporte nutricional adequado que, em combinação com o tratamento correto de feridas, resultará numa diminuição da morbilidade, tempo de internamento e melhoria da qualidade de vida.

Referências bibliográficas:

1. Demling RH. Nutrition, anabolism, and the wound healing process: an overview. Eplasty. 2009;9:e9. Epub 2009 Feb 3. PMID: 19274069; PMCID: PMC2642618.
2 - Montenegro Susana. Proteína e cicatrização de feridas. Nutrícias [Internet]. 2012 Set. Disponível aqui.
- Dias CAMSV. Nutrição e cicatrização de feridas
– Suplementação Nutricional? 2009. Monografia
– Faculdade de Ciência da Nutrição e Alimentação
– Universidade do Porto. Disponível aqui.




Artigo publicado na edição de fevereiro do Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.

 

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