«Cuidados Paliativos Pediátricos: é essencial uma abordagem pluridisciplinar e integradora»
Joana Pimenta
Pediatra. Pós-graduada em Cuidados Paliativos Pediátricos. Coord. da Equipa Intra-Hospitalar de CPP, ULS DE Viseu Dão-Lafões. Coautora do livro Cuidados Paliativos Pediátricos - Perspetivas Multidisciplinares (LIDEL)
Abordar os Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP) é refletir sobre cuidados ativos e holísticos, prestados a crianças e jovens com doenças crónicas complexas e ameaçadoras da vida.
Envolvem intervenções especializadas, programadas, dirigidas e individualizadas, com o intuito de obter o bem-estar físico, psicológico, emocional e espiritual das crianças e das suas respetivas famílias.
Devem ser implementados ao longo de toda a trajetória de doença, iniciando-se no diagnóstico – que pode ocorrer antes do nascimento – e acompanhando a criança ao longo do seu percurso. Mais do que cuidados de fim de vida, promovem qualidade de vida, independentemente do prognóstico, garantindo o bem-estar da criança e da sua família em todas as fases da doença.
Os CPP distinguem-se significativamente dos cuidados paliativos em adultos, tanto pela sua abordagem como pela complexidade das situações envolvidas.
Pretendem dar respostas a uma grande variedade de doenças, muitas vezes raras e com trajetórias imprevisíveis, incluindo as neurodegenerativas, metabólicas, genéticas, oncológicas e cardíacas, entre outras.
Em idade pediátrica, os cuidados paliativos são muitas vezes prolongados no tempo, coexistindo com tratamentos curativos ou de reabilitação, podendo resultar numa alta (quando a cura é possível) ou na transição para as equipas de adultos. Não negligenciado o impacto social e emocional da doença na criança, os cuidados são centrados na unidade funcional criança-família.
Face à exigência das competências necessárias, o trabalho em equipa interdisciplinar é a essência dos cuidados paliativos integrados e humanizados. Valorizar cada profissional, promover a comunicação aberta e a partilha de decisões são elementos-chave para garantir cuidados verdadeiramente globais e dignos. A abordagem do trabalho em equipa deve centrar-se na valorização da vida, no fortalecimento da esperança e na criação de condições que permitam potenciar a qualidade de vidas dos pacientes pediátricos e das suas famílias.
A 12 de outubro de 2024 – Dia Mundial dos Cuidados Paliativos – celebrou-se o 10.º aniversário da resolução para o desenvolvimento dos Cuidados Paliativos, aprovada na Assembleia Mundial de Saúde (órgão da Organização Mundial de Saúde) e que encoraja os países a “fortalecer os Cuidados Paliativos como um componente dos cuidados abrangentes ao longo da vida”.
Joana Pimenta
Sob o mote “Dez anos após a resolução, como estamos?”, fomos convidados a refletir sobre o estado atual dos cuidados paliativos e o desenvolvimento de políticas de saúde que proporcionem o acesso equalitário e em tempo útil a estes cuidados diferenciados.
Em Portugal, estima-se que cerca de 8000 crianças tenham necessidades paliativas e que somente 10% tenham acesso a estes cuidados, com apenas sete equipas pediátricas intra-hospitalares reconhecidas pela Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS). Muitas outras estão disseminadas pelo país e em processo de “germinação”. Contudo, encontram várias dificuldades para cumprir os requisitos mínimos divulgados no Plano Estratégico para o Desenvolvimento dos Cuidados Paliativos.
São exemplos dos desafios atuais a falta de alocação de recursos humanos especializados, a necessidade de maior formação em CPP, o acesso desigual de acordo com a região do país e a falta de reconhecimento social e institucional da necessidade/relevância destes cuidados. São, por isso, um verdadeiro desafio de colaboração e organização entre os vários intervenientes na procura de criar soluções eficazes e sustentáveis, independentemente dos recursos disponíveis.
A criação e promoção de protocolos de cooperação entre diversos profissionais e entidades representa uma oportunidade estratégica para a disseminação dos CPP na comunidade.
Em Viseu, fruto da parceria local estabelecida em 2019 entre a atual Unidade Local de Saúde de Viseu Dão-Lafões e o Instituto Piaget – ISEIT de Viseu, nasceu a obra Cuidados Paliativos Pediátricos – Perspetivas Multidisciplinares, que pretende sensibilizar para a importância dos CPP na dimensão da criança, da família e da comunidade, promovendo o trabalho em equipa, a articulação entre serviços e a humanização dos cuidados, especialmente em contexto de fim de vida.