«Menos culpas, mais soluções: a crise no SNS não se resolve com acusações»


Xavier Barreto

Presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH)



A cada novo encerramento de um serviço de urgência, a reação política repete-se: acusações cruzadas entre partidos, troca de responsabilidades, discursos inflamados nas televisões e nas redes sociais. Entretanto, os serviços continuam a encerrar, os profissionais continuam exaustos e os cidadãos continuam a enfrentar um SNS que, em demasiadas zonas do país, já não responde com a prontidão e a segurança que se exige.

Vivemos uma crise de recursos humanos no Serviço Nacional de Saúde. Não é nova. Não é inesperada. E não é fruto de um episódio isolado ou de uma decisão mal tomada na última legislatura. É o resultado acumulado de anos – décadas – de desinvestimento no SNS e nos seus profissionais. É consequência direta da incapacidade política de antecipar, planear e implementar medidas estruturadas que valorizem as carreiras da saúde, promovam a atratividade do setor público e garantam condições de trabalho dignas.

A tentação de apontar o dedo a quem está no governo ou a quem lá esteve anteriormente é compreensível do ponto de vista político, mas profundamente inútil do ponto de vista da governação. Esta lógica de confronto permanente tem sido um dos maiores entraves à construção de soluções duradouras. Discutem-se os sintomas, ignoram-se as causas. Reage-se aos episódios, sem estratégia para o sistema.

A ausência de um verdadeiro pacto político para a saúde – que ultrapasse calendários eleitorais e ciclos governativos – tem um preço. E esse preço paga-se todos os dias nos corredores dos hospitais, nos turnos que não se conseguem preencher, nos médicos que desistem do SNS, nas populações que deixam de ter acesso a cuidados de proximidade.

Xavier Barreto

É urgente recentrar o debate. A discussão pública sobre o SNS não pode continuar a ser dominada por narrativas simplistas ou por agendas partidárias de curto prazo. Precisamos de responsabilidade política e maturidade institucional para fazer o que há muito se impõe: investir de forma séria nos profissionais de saúde, repensar o modelo de organização
dos cuidados e garantir a sustentabilidade do sistema para as próximas gerações.

Porque não é atirando culpas que se salvam serviços de urgência. É com compromisso, visão e coragem política.


O artigo pode ser lido no Jornal Médico 135.

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