Opinião
«Uma solução para a Saúde Materna e Obstétrica»
Luís Filipe Barreira
Bastonário da Ordem dos Enfermeiros (OE)
A Diretiva Comunitária que determina o âmbito do exercício profissional dos enfermeiros especialistas em Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica (EEESMO), entre outros profissionais, embora parcialmente transposta para o ordenamento jurídico português pela Lei 9/2009, de 4 de março, nunca chegou a ser regulamentada, não permitindo que esta especialidade seja exercida em Portugal nos mesmos termos que ocorre em outros países da Europa.
Há longos anos que o Estado português se mantém numa situação de ilegalidade e incumprimento perante a União Europeia, prejudicando, sem motivos atendíveis, por um lado, o livre exercício da profissão de enfermeiro, e, por outro, o direito ao acesso a cuidados de saúde especializados, que é reconhecido a toda a população.
Os recorrentes constrangimentos no acesso a cuidados de saúde na área da Saúde Materna e Obstétrica, que se agudizam em algumas épocas do ano, impõem uma atuação rápida, eficaz e, sobretudo, racional.
Os EEESMO estão em condições de assegurar, de imediato, a assistência, com autonomia, às grávidas e partos de baixo risco, quer nos hospitais e maternidades, quer nos cuidados de saúde primários, libertando, deste modo, os profissionais médicos para situações mais complexas.
Esta solução permitiria resolver uma parte substancial dos problemas atuais. É preciso não esquecer que, salvo evidência contrária, a gravidez e o trabalho de parto não são doenças e que os EEESMO possuem a competência necessária para atuar, com autonomia, na gravidez e partos normais.
Luís Filipe Barreira
Acresce que as intervenções dos EEESMO potenciam o respeito pelo processo fisiológico do trabalho de parto, que é amplamente reconhecido como a opção mais saudável. Como, aliás, refere a presidente da Mesa do Colégio da Especialidade de Enfermagem de Saúde Materna e Obstétrica EEESMO da Ordem dos Enfermeiros, Alexandrina Cardoso:
“Os benefícios para a saúde são inequivocamente comprovados pelas evidências disponíveis: aumento da probabilidade de parto vaginal espontâneo e de períneo intacto, do nível de satisfação com os cuidados e com a experiência do parto e da probabilidade de sucesso na amamentação, e, com tudo isto, menor probabilidade de cesariana, associado a menores custos em recursos humanos e materiais, menores taxas de intervenções, como analgesia neuroaxial, uso de ocitocina sintética, com taxas de mortalidade perinatal e índice de Apgar sobreponíveis.”
Naturalmente, mais competências implicam uma maior responsabilidade e uma maior responsabilidade implica, necessariamente, uma valorização acrescida do trabalho dos EEESMO.
Assim, creio ser essencial abordar esta reconfiguração das intervenções autónomas dos EESMOS pondo de lado eventuais questões corporativas e trabalhando em consensos que beneficiem a população e o país.
É por esse motivo que a Ordem dos Enfermeiros quer manter um diálogo franco e aberto com a Ordem dos Médicos para, em conjunto com o Governo, que já apontou este caminho no Plano de Emergência e Transformação da Saúde, encontrar uma solução imediata e consensual.
A regulamentação da atuação dos EEESMO é, na verdade, um passo necessário e urgente para promover a qualidade dos cuidados de saúde e para fortalecer a saúde materna e obstétrica no país. Investir na autonomia dos EEESMO é investir no bemestar e saúde.
O artigo pode ser lido na edição de setembro do Jornal Médico dos Cuidados de Saúde Integrados.