Atleta olímpica e médica de família: «com determinação e paixão conseguimos ultrapassar todos os obstáculos»
"É sempre muito complicado o processo de conciliação de duas carreiras caracterizadas por um elevado consumo de tempo", afirma Ana Rente. A atleta de ginástica de trampolim e médica interna na USF Jardins da Encarnação é a convidada especial das Jornadas Médico Ativo - Paciente Ativo, que se realizam já no sábado.
Em entrevista à Just News, Ana Rente começa por explicar que, enquanto estudante sentiu "uma maior facilidade", já que o horário "é mais flexível, a maioria das aulas não tem um carácter de obrigatoriedade e as faltas dadas são justificadas, reflectindo-se no entanto a nível de nota final da cadeira".
Na sua opinião, "a conciliação neste caso penso que passa pela gestão do tempo. Saber quando focar numa carreira em detrimento da outra."
Ana Rente na USF Jardins da Encarnação, em Lisboa.
Relativamente ao internato de Medicina Geral e Familiar, afirma que "existe uma maior dificuldade no processo de conciliação uma vez que a carga horária semanal é fixa (40h), tendo de existir uma adaptação ao nível do horário dos treinos".
Acrescenta também que "outras questões que surgem são o atraso constante do internato e o adiar inevitável da entrada na especialidade devido às diversas ausências, quer por estágios desportivos quer por competições que terão de ser compensadas posteriormente".
Refere ainda que, por outro lado "existe todo o carácter físico e psicológico inerente a este esforço de conciliação. O cansaço físico e psicológico acumula-se comprometendo quer a performance desportiva quer a disponibilidade mental para efectuar o raciocínio clínico. Existe um agravamento desta situação devido à consequente implementação de rotinas diárias baseadas essencialmente em trabalhar-treinar-trabalhar."
Saber quando "suspender" uma das carreiras
Questionada sobre se teve, ao longo destes anos, alguns momentos mais complicados, em que uma das carreiras tenha ficado prejudicada, a atleta olímpica afirma: "Recentemente, tive um desses momentos complicados na preparação para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro. Estava a trabalhar e a intensificar os treinos durante a preparação olímpica e chegou a um ponto em que me senti completamente em burnout."
A atleta do Lisboa Ginásio Clube sublinha que, nessa altura, "sentia que não estava a conseguir fazer nenhuma das duas coisas como eu gostaria e como ambicionava". Tomou então uma decisão: "Suspender o internato durante 2 meses de forma a poder estar completamente focada nos treinos". E não tem qualquer dúvida: "A conciliação das duas carreiras passa muito por esta gestão de saber quando abdicar de uma delas em deterimento da outra".
"Senti um enorme carinho quando voltei à USF"
"Estou na USF Jardins da Encarnação há cerca de um ano e meio e o processo de formação tem sido bom", indica Ana Rente. Na sua opinião, o facto de ser a única interna na USF traz vantagens e desvantagens: "Como desvantagens, não é um centro direccionado para a formação, não existem reuniões clínicas para discussão de casos/apresentação de trabalhos e não existem outras pessoas na mesma situação que eu com quem possa trocar ideias. No entanto, existe outra USF no mesmo Centro de Saúde onde estão duas internas o que acaba por ser positico neste sentido."
Ana Rente com a coordenadora da USF Jardins da Encarnação (à direita), Matilde Pinto, e com outros elementos da unidade.
Por outro lado, "tem algumas vantagens como por exemplo, não haver necessidade de partilhar o espaço físico de consulta com outro interno, haver necessidade de me empenhar ainda mais na minha formação e construir a minha autonomia no sentido de me tornar uma melhor médica de família".
Relativamente ao seu regresso das Olimpíadas do Rio 2016 à unidade de saúde, não hesita na resposta: "Senti um enorme carinho quando voltei à USF, quer por parte dos profissionais de saúde quer por parte dos auxiliares. É sempre óptimo sentir o reconhecimento por parte das pessoas que nos rodeiam e perceber que a minha prestação tinha deixado todos orgulhosos foi a cereja no topo do bolo."
Uma prescrição "mais eficiente" do exercício físico
Ana Rente será a convidada especial da próxima edição das Jornadas Médico Ativo – Paciente Ativo, que se realizam no sábado, em Lisboa, e cujo conceito inovador passa pela mensagem global de que os “médicos, quando também eles praticantes, promovem um aconselhamento para a atividade física mais eficaz e são mais persuasivos junto dos seus pacientes”.
Ana Rente com os elementos da Comissão Organizadora das Jornadas promovida pela Clínica das Conchas: Nuno Marreiros, diretor-geral do CEC - Clinical Exercise Center, Rodrigo Ruivo, coordenador do Centro de Exercício da Clínica das Conchas, e Jorge Ruivo, médico internista e coordenador do Centro de Reabilitação da Clínica das Conchas.
A médica interna de MGF afirma "concordar plenamente" com esta ideia, salientando: "Se o médico praticar desporto, consegue promover a prática de exercício físico de uma forma mais eficiente, sabendo escolher individualmente e caso a caso qual a actividade física mais indicada".
Determinação e paixão para "atingir todos os nossos objectivos"
Convidada a dar uma sugestão ou conselho a estudantes e jovens médicos para que consigam "ser eles próprios um exemplo de que é possível conciliar a Medicina com a prática regular de atividade física", tal como refere a Comissão Organizadora das Jornadas, Ana Rente afirma:
"Creio que o ponto-chave na conciliação das duas carreiras é a determinação. Se a pessoa estiver motivada e empenhada em conciliar as duas carreiras tudo se torna mais simples. Quando a isto se adiciona a paixão em relação àquilo que fazemos, conseguimos ultrapassar todos os obstáculos com o intuito de atingir todos os nossos objetivos."
O programa da VI Jornadas Médico Ativo - Paciente Ativo, bem como outras informações sobre o evento podem ser consultadas aqui.
A inscrição pode ser efetuada online.