CHUC inaugura internamento específico para fases iniciais da psicose
A criação de uma Unidade de Internamento do Primeiro Episódio Psicótico contribui para “uma recuperação mais célere e evidente” de uma situação que se manifesta sobretudo na transição da adolescência para a vida adulta, considera o diretor do Centro de Responsabilidade Integrado de Psiquiatria (CRI) de Psiquiatria do CHUC, Horácio Firmino.
Ao intervir na sessão de inauguração de uma nova unidade do CRI de Psiquiatria do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra, Horácio Firmino sublinhou ser a mesma “dedicada a um grupo vulnerável e usualmente negligenciado nas respostas de saúde”.
Apresentada como uma unidade multidisciplinar que pretende dar resposta a um evento de saúde crítico que ocorre habitualmente no final da adolescência ou no início da vida adulta – denominado primeiro episódio psicótico --, ocupa parte do espaço de internamento do Pavilhão 8 do Hospital Sobral Cid, instituição localizada nos arredores de Coimbra e que integra o CHUC.
Horácio Firmino
A cerimónia de inauguração, que teve lugar recentemente e que serviu para assinalar o Dia Mundial da Saúde (7 de abril), contou com a presença do presidente do Conselho de Administração do CHUC. Salientando o aspeto inovador do projeto, Carlos Santos afirmaria que “os resultados obtêm-se quando há ousadia, quando há vontade de fazer diferente e capacidade de inovação”.
E fez questão em agradecer a Horácio Firmino e aos elementos da sua equipa – em especial aos mais diretamente envolvidos na criação desta nova unidade – a sua “persistência na implantação de soluções inovadoras” e o “foco permanente que têm nos doentes”.
A Unidade de Internamento do Primeiro Episódio Psicótico (UIPEP) integra a Unidade de Psicose, coordenada pelo psiquiatra António Bajouco, e funcionará em estreita ligação com a Unidade de Reabilitação, instalada noutro dos pavilhões do Sobral Cid.
António Bajouco e Carlos Santos
Isso mesmo foi explicado pelo também psiquiatra Miguel Bajouco, que usou da palavra na sessão para realçar, por exemplo, que a atividade da UIPEP decorrerá em articulação com a Consulta do Primeiro Episódio Psicótico, a que ele próprio também está ligado.
Implementada no CRI de Psiquiatria do CHUC desde 2011, “constitui a resposta a nível ambulatório para estes doentes”, funcionando – à semelhança do Hospital de Dia, por exemplo – no edifício dos Hospitais da Universidade de Coimbra.
Em declarações à Just News, o psiquiatra Nuno Madeira, diria que a criação da UIPEP “é uma resposta que complementa e é sinérgica com a consulta” que coordena, justificando:
“Estes doentes, por vezes, a meio do processo, voltam a precisar de ser internados e a existência de uma equipa diferenciada, que consiga organizar-se e oferecer cuidados mais específicos do que os que seriam proporcionados numa cama de Psiquiatria geral é, com certeza, uma mais-valia.”
Nuno Madeira
Horácio Firmino: criação da nova unidade é “relevante e necessária”
O diretor do CRI de Psiquiatria do CHUC não deixou de frisar que o primeiro episódio psicótico é uma doença que “tem um impacto no curso de vida das pessoas afetadas devido à disfunção cognitivo-perceptual, emocional e comportamental, interferindo significativamente na sua vida social e profissional”.
Acrescentou saber-se hoje que “uma adequada intervenção na fase inicial da psicose terá como potenciais benefícios uma recuperação mais célere e evidente, com conservação das aptidões sociais, dos suportes sociais e familiares, da melhoria do prognóstico global, bem como da redução da mortalidade e das taxas de internamento”.
Horácio Firmino explicou ter-se entendido como “relevante e necessária” a implementação no CHUC de uma unidade de internamento especializada na intervenção precoce nas fases iniciais de doenças mentais graves com sintomas psicóticos e que “venha completar as respostas já existentes”.
Referiria a Consulta do Primeiro Episódio Psicótico, “com resultados já reconhecidos”, e o trabalho desenvolvido pela Unidade de Cuidados Avançados de Esquizofrenia Resistente ao Tratamento (UCAERe-T), que com a recém-criada UIPEP ocupa o Pavilhão 8 do Hospital Sobral Cid, constituindo ambas a Unidade de Psicose.
Célia Cravo, Horácio Firmino, António Bajouco, Joaquim Rodrigues, Carlos Santos, Miguel Bajouco, Pedro Simões
Carlos Santos: um investimento global superior a 2,5 milhões de euros
Na sua intervenção, Carlos Santos não hesitou em considerar que, “efetivamente, a Saúde Mental tem sido o parente pobre da Saúde”, reconhecendo a necessidade de “políticas ativas de proteção dos mais frágeis”.
Também não teve dúvidas em afirmar, perante quem o ouvia: “Nós temos aqui equipas jovens de altíssima competência, que garantem que, efetivamente, o futuro da Psiquiatria em Coimbra será de elevada qualidade.”
Carlos Santos
Admitindo que o investimento financeiro na criação da UIPEP “não foi vultuoso”, esclareceu estar esta inauguração “integrada num projeto mais vasto”, que está em curso. E referiu-se então à “melhoria das condições dos doentes psiquiátricos, particularmente com especial foco nos da Psiquiatria Forense, onde estamos fortemente empenhados em mudar as condições de internamento”.
Anunciando um investimento global superior a 2,5 milhões de euros, “num alinhamento forte que temos mantido” com o Programa Nacional para a Saúde Mental da DGS e com o Ministério da Justiça, afirmou:
“Acho que podemos perspetivar uma melhoria das condições de trabalho e de atendimento dos utentes, de melhoria global da prestação de cuidados aos nossos doentes, que são a razão da nossa existência.”
Elementos da Unidade de Internamento do Primeiro Episódio Psicótico
Miguel Bajouco: “atividade científica alicerçará uma melhor intervenção terapêutica”
Quando usou da palavra, Miguel Bajouco procurou deixar clara a importância da “intervenção precoce” – conceito que emergiu nas últimas duas décadas – na abordagem dirigida à fase inicial do processo psicótico.
É ponto assente que os primeiros anos da doença são considerados um período crítico para: prevenir a deterioração biológica e psicossocial do indivíduo; melhorar o prognóstico; reduzir o risco de recaída; eventualmente, atenuar a progressão da doença.
Por outro lado, “a implementação de serviços especializados no tratamento das fases iniciais da psicose, como é o caso desta unidade, representam respostas diferenciadas na Psiquiatria, que vão de encontro ao estado da arte e seguem as guidelines internacionais”.
Quanto à integração das duas unidades (ou subunidades) que constituem a Unidade de Psicose (a UCAERe-T e a UIPEP), ela traduzir-se-á “numa resposta assistencial mais completa às necessidades dos doentes que se encontram em períodos críticos das doenças psicóticas: fases iniciais (primeiro episódio psicótico) e formas resistentes à terapêutica”.
Entretanto, a ligação à Unidade de Reabilitação vai permitir que as pessoas internadas na UIPEP “beneficiem de respostas de natureza psicossocial já existentes, como programas de readaptação funcional em desenvolvimento, como é o caso da Terapia Ocupacional, da Reabilitação Cognitiva e da Formação Profissional”.
Miguel Bajouco quis destacar um último aspeto, que se prende com a atividade científica da unidade agora inaugurada, que será desenvolvida em articulação com o Grupo de Investigação e Intervenção Precoce na Psicose, coordenado por António Macedo, professor catedrático de Psiquiatria da FMUC, mas não só.
A ligação também existirá, nomeadamente, com o Instituto de Psicologia Médica da FMUC -- centro de referência na área da psicose -- e com o Instituto de Ciências Nucleares Aplicadas à Saúde (ICNAS)/Centro de Imagem Biomédica e Translacional (CIBIT) – centro de referência em técnicas de neuroimagem.
Miguel Bajouco
“Esta atividade científica alicerçará uma melhor intervenção terapêutica, cumprindo os objetivos orgânicos de um hospital universitário de referência e procurando contribuir para o prestígio da instituição”, concluiu Miguel Bajouco.
A reportagem pode ser lida na LIVE Psiquiatria e Saúde Mental.