Pediatria: Consulta de Enfermagem ajuda crianças em situação de risco psicossocial
Graça Santana é a única enfermeira a realizar a Consulta de Enfermagem de Pediatria de Risco Psicossocial que existe no Centro Hospitalar Universitário de Coimbra, uma valência que considera ser "particularmente relevante" porque permite intervir de uma forma precoce e criar uma relação de confiança duradoura.
Na Maternidade Bissaya Barreto há 40 anos, foi após estar 33 anos integrada na Unidade de Cuidados Intensivos Neonatais que passou para a Unidade de Intervenção Precoce na Relação Mãe/Filho.
Encaminhamento de crianças em situação de risco
Nesta consulta de Enfermagem são seguidas "grávidas de risco psicossocial com problemas socioeconómicos e risco psiquiátrico, onde se destacam casos de toxicodependentes adolescentes e imigrantes que aguardam a sua legalização, e seus filhos".
Desta Unidade faz parte uma equipa multidisciplinar, composta por obstetra, pediatra, psiquiatra, psicólogo, enfermeira e assistente social e educadora. Alguns destes profissionais constituem a Comissão Técnica do Núcleo de Apoio a Crianças e Jovens em risco (NACJR) existente nesta Unidade. E é em reuniões quinzenais que a equipa avalia e orienta as diversas situações.
Além de na consulta de Enfermagem serem seguidos os filhos das mães que já eram previamente acompanhadas na Unidade, somam-se também as crianças encaminhadas após a identificação de alguma situação de risco.
Destacando o facto de estas consultas não substituírem as que se realizam nos centros de saúde, "que acabam por ser mais regulares", Graça Santana evidencia que a sua função é “identificar e avaliar a capacidade e competência dos pais e da família no cuidar da criança, promovendo a aquisição de conhecimentos que contribuam para um desenvolvimento saudável”.
Graça Santana
Dar apoio a outras consultas
Neste contexto de pandemia, admite ter-se verificado “uma grande redução de consultas e de entrada de acompanhantes, dificultando este trabalho”.
No entanto, adianta que, “com facilidade, se existir o tempo e o espaço adequado, as mães partilham os seus desabafos e as suas vivências, acabando por se criar uma relação sólida e duradoura”. Como explica, “estas mães acabam por sentir-se muito apoiadas e ter a facilidade de telefonar ou deslocar-se aqui quando necessitam”.
A enfermeira acredita ainda que o estabelecimento desta relação de confiança acaba por ser "favorecido com o apoio que ela própria confere a outras consultas", nomeadamente a nível da patologia renal, risco psiquiátrico e psicológico e ainda de follow-up de infeções ou a grandes prematuros, procedendo a avaliações estatoponderais e a colheita de espécimes para análise.
Assegurar sempre o acompanhamento à mãe
Enfermeira especialista em Saúde Infantil e Pediátrica, Graça Santana refere que o seguimento das crianças nesta consulta só se inicia quando estas já têm pelo menos um mês, verificando-se “alguma confusão por parte dos pais, sobretudo no que diz respeito à alimentação do filho”.
Por esse motivo, reconhece que "gostaria muito de poder acompanhar também essa fase inicial, que é a de maior desorientação, sobretudo em relação ao aleitamento materno", recordando que "muitas mães nunca cuidaram de uma criança, não têm a menor ideia de como tratar um bebé, até porque são frequentemente mães adolescentes".
Perante a dificuldade de algumas mães em deslocarem-se à instituição hospitalar, “verificando-se que estão relativamente bem orientadas, têm algum apoio familiar e dirigem-se regularmente ao centro de saúde, ficam somente sob responsabilidade dos cuidados de saúde primários, com a ressalva de poderem ser novamente encaminhadas, perante alguma eventualidade”.
Quando não comparecem na data da consulta hospitalar, Graça Santana explica que se procede sempre ao contacto com o centro de saúde e à elaboração de nova convocatória, com vista a “nunca terminar o seguimento de uma mãe sem que tenha alguma orientação. Nunca vão desamparadas."
Troca de ideias e de experiências com o médico pediatra
Graça Santana realça que "esta é uma consulta totalmente independente da Consulta de Pediatria, que procura, entre outras coisas, acompanhar o desenvolvimento da criança, numa complementaridade das consultas de saúde infantil que decorrem no centro de saúde”.
Considera, aliás, que essa autonomia é uma característica importante da consulta, que se reflete em termos de acompanhamento do desenvolvimento e de alimentação, dando o exemplo dos folhetos de informação sobre alimentação, que foram realizados sob as suas orientações. Ou seja, de uma forma geral, "o médico faz a avaliação dele, mas sem interferir com a minha."
Esclarece ainda que “naturalmente, existe depois uma troca de ideias e de experiências com o médico pediatra, até porque muitas vezes tem de se tomar a decisão de contactar a Psicologia ou o Serviço Social, por exemplo”.
"A minha finalidade é ver o todo"
"O que eu digo muitas vezes às mães é que a minha finalidade é ver o todo", refere Graça Santana. Algo que não tem sido "nada fácil" nos últimos tempos, devido à pandemia, conforme explica:
"Normalmente entrava a família toda na consulta e isso permitia-me verificar qual a dinâmica que existe, o comportamento da própria mãe, etc. Neste momento não tenho essa possibilidade de ver como a família funciona."
Contudo, e porque "se dermos espaço e tempo, são mães que acabam por desabafar e dizer o que se passa, como é a sua vivência e as dificuldades que atravessam", Graça Santana salienta a importância desta relação, com base no respeito e em "querer genuinamente saber o que se passa".
Enquanto num cenário prévio à pandemia eram realizadas cerca de uma dezena de consultas diárias, neste contexto, o número diminuiu para metade. Contudo, "já se verifica lentamente o retorno à normalidade".