Hospital da Luz Learning Health: há 8 anos a «contribuir para a investigação, formação e inovação em saúde»
No final desta semana realiza-se o “grande evento” de investigação do grupo Luz Saúde. Será uma oportunidade única para dar a conhecer os principais projetos de investigação desenvolvidos nas unidades Hospital da Luz com o apoio do Hospital da Luz Learning Health, “uma estrutura muito dinâmica”, criada em 2015, e que tem contribuído e impulsionado “a investigação, a formação e a inovação em saúde”.
Na Luz Saúde existem já 6 grupos multidisciplinares dedicados à investigação. O papel que o Hospital da Luz Learning Health (HL LH) tem vindo a desempenhar vai muito além do apoio financeiro e tem contribuído de forma muito positiva para o crescimento desta área, conforme explica Francisca Leite, diretora executiva do HL LH, em entrevista à Just News.
A responsável salienta também que o 2.º Congresso de Investigação do Hospital da Luz, que decorre esta sexta-feira, terá este ano um conjunto de palestras “extremamente relevantes”. Serão abordadas questões como a captação de financiamento para investigação ou o “enorme impacto” que vai ter o European Health Data Space.
Esta 2.ª edição tem ainda outra novidade. Está aberta a todos os profissionais com interesse na área de investigação em saúde, ou seja, não é exclusivo a colaboradores do grupo Luz Saúde.
Em formato presencial e webinar, a expectativa em relação à participação é, por isso, bastante elevada, “como não podia deixar de ser”, afirma Francisca Leite. E percebe-se porquê. Se no ano passado o auditório já esteve cheio com a primeira edição…
Francisca Leite
Just News (JN) - Quando é que a estrutura do Hospital da Luz Learning Health (HL LH) foi criada?
Francisca Leite (FL) - Este projeto arrancou em setembro de 2015 e, de início, já contava com estas 3 áreas de atuação: Investigação, Formação e Inovação.
Ao fim destes quase oito anos de atividade, o balanço é muito positivo. Continuamos a crescer e a aumentar a nossa atividade. Somos agora uma estrutura completamente diferente com uma equipa de cerca de 40 colaboradores.
De qualquer forma, importa salientar, que este enorme crescimento também é possível porque já existiam outras equipas - dentro do Grupo Luz Saúde - a desenvolver estas atividades. Na gestão de ensaios clínicos ou na área da formação, por exemplo, já existiam pequenas equipas que, quando se formou o HL LH, foram integradas nesta estrutura e trouxeram experiência e um conhecimento acumulado.
Foram também criadas áreas de raiz e de grande aposta, como é o caso do Centro de Simulação ou da Inteligência Artificial. Ou seja, nem todo o crescimento derivou de uma fusão de esforços de pessoas que já pertenciam ao Grupo, há também muitas pessoas novas que se juntaram a este projeto.
Em relação à atividade dedicada à investigação, que é o foco da nossa conversa, desde 2015, duplicámos o número de ensaios clínicos e quintuplicámos o número de projetos dedicados à investigação que existiam antes do HL LH.
JN - Desde 2010 que foram já ultrapassadas as duas centenas de ensaios clínicos, certo?
FL - Sim, o número de ensaios clínicos aumentou muito, principalmente nos últimos anos. É um número que nos deixa a todos muito satisfeitos.
Em particular porque somos um grupo de saúde privado e, sendo a maioria dos ensaios clínicos na área de Oncologia, não seria expectável que tivesse grande expressão.
JN - Os seis grupos de investigação que atualmente existem foram criados no âmbito do HLLH?
FL - Foi uma iniciativa da Comissão de Investigação, muito promovida pela Prof.ª Marília Cravo. O financiamento é do grupo Luz Saúde, e todo o processo é gerido pelo HL LH. Todo o processo que começa com a candidatura, passa pela execução e pós-execução, acompanhamento, monitorização e avaliação anual. Esta gestão é realizada pelo HL LH.
A nossa estrutura tem um papel muito ativo e importante no desenvolvimento e crescimento destes grupos de investigação, mas é claro que a génese e a dinâmica do grupo é que vai ditar o sucesso e o desenvolvimento da sua atividade. Posso dar um exemplo: A Prof.ª Marília tem o grupo GENIUS. É um grupo que se destaca pela capacidade que tem de ir buscar financiamento externo, mas isso também acaba por ser possível porque há aqui uma estrutura de suporte que faz toda a parte burocrática, de acompanhamento e até de identificação de oportunidades de financiamento. Isto é muito importante porque o financiamento que temos, e que estamos a dar, é muito bom mas por vezes não chega para aquilo que estes grupos de investigação querem e podem fazer.
Em 2020, já éramos o grupo privado que mais apostava em investigação em Portugal e continuamos a crescer e a investir. Temos conseguido mais financiamento externo e temos aumentado o número de candidaturas a projetos europeus e a projetos no âmbito do PRR. Ou seja, temos mais investimento externo mas temos também mais investimento nosso.
Dou como exemplo uma conquista recente, no âmbito da rede nacional de Test Beds. Concorremos a um Test Care e ganhámos, e este projeto – financiado em parte pelo PRR - também tem um investimento considerável por parte da Luz Saúde.
JN - E em que consiste exatamente o Test Bed?
FL - É um espaço dirigido a pequenas e médias empresas ou start-ups que tenham produtos inovadores e queiram melhorar estes produtos para ficarem mais perto da comercialização. No nosso caso, os produtos são da área da saúde.
A Plataforma Intelligent Health (PIH) possui três níveis de atividade para desenvolver e testar soluções de saúde digital: ensaios in silico, ensaios de simulação e ensaios no mundo real. Estes níveis proporcionam uma abordagem abrangente que começa com o desenvolvimento inicial baseado em dados diversificados, padronizados e anonimizados, seguido pelo desenvolvimento e teste em ambientes quase reais criados no nosso centro de simulação e, finalmente, pela realização de testes no hospital real, onde doentes e profissionais de saúde participam diariamente em ensaios clínicos, promovendo a inovação na saúde. A iniciativa faz parte da Rede Nacional de Test Beds de Portugal, com o objetivo de acelerar 50 soluções inovadoras em 3 anos.
JN - Dia 21 de abril realiza-se o 2.º Congresso de Investigação da Luz Saúde. A edição deste ano está mais aberta a profissionais exteriores
FL - Temos investigação de muita qualidade dentro do Grupo e queremos dar a conhecer o que está a ser feito, dar palco aos nossos investigadores e, idealmente, ter novos profissionais a interessarem-se por esta área e a concorrer com novos projetos de investigação.
Temos outros pontos de agenda muito interessantes para os nossos investigadores e para investigadores externos também. O primeiro ponto é dedicado ao financiamento, porque é muito importante que os nossos investigadores conheçam as principais fontes de financiamento competitivo, ouçam as experiências de pessoas que têm um conhecimento profundo na matéria, e saibam como é que o HL LH os pode apoiar neste processo.
Outro ponto de agenda é dedicado à regulação do European Health Data Space que, num futuro próximo, vai ter impacto a todos os níveis. É uma área de grande importância para todos os que trabalhamos em saúde, e é fundamental estarmos atualizados em relação a este tópico. Vai trazer muitos desafios mas também oportunidades, e dentro da área da engenharia e ciência de dados achámos importante começar a falar sobre isto.
JN - E o que é que aí vem?
FL - Esta iniciativa do European Health Data Space é, resumidamente, ter um espaço europeu de dados de saúde. Vão existir outros Data Spaces em sectores diferentes, mas as entidades europeias decidiram começar pela saúde, por ser o mais difícil.
Provavelmente, é algo que será aprovado em tempo recorde. Presumo que vá ter um tempo de implementação de cerca de 10 anos. E o que é que isto implica na prática? Que os dados não fiquem “bloqueados” nas fronteiras entre países. Ou seja, um doente vai realmente ser dono dos seus dados de saúde, pode ser cliente de hospitais em diferente países e todos eles terão acesso e vão conseguir ler esses mesmos dados e saber tudo o que aconteceu ao doente.
Vai, portanto, existir uma continuidade de cuidados entre países da união europeia e entre qualquer hospital. Naturalmente, é um processo que será faseado, mas é algo que vai colocar de facto o doente no centro e como responsável pela sua saúde.
E o que é que isso implica? Tem implicações, desde logo, nos sistemas eletrónicos de registos clínicos, que passarão a ser considerados dispositivos médicos e terão de ser certificados.
Esta disponibilização de dados tem imensas implicações para as quais ninguém está ainda sensibilizado. A maior parte das pessoas não sabe sequer que isto existe. Nós pretendemos alertar para isto, pois levanta imensas oportunidades. Já existe, aliás, muito financiamento para esta área.
JN - A Inteligência Artificial será também um dos temas a abordar no Congresso. Que trabalho tem o HLLH desenvolvido neste contexto?
FL - Estamos a constituir a equipa e temos trabalhado muito com universidades e com institutos de investigação, mais na área da engenharia, obviamente. Já temos e já tivemos alguns projetos com financiamento.
A nossa lógica é sempre: temos médicos, temos enfermeiros, temos engenheiros. É trabalho de equipa. Como engenheiros, podemos perceber a técnica, mas não somos os prestadores de cuidados, pelo que é preciso haver um diálogo e interpretar resultados. Todos os nossos projetos, que são vários, são constituídos por equipas multidisciplinares.
Neste momento, o maior projeto que temos é o InteligenteCare, que tem como objetivo entender melhor a multimorbilidade, perceber como é que se tratam doentes com duas ou mais doenças crónicas. Normalmente estes doentes têm vários médicos mas, infelizmente, muitas vezes não existe o “médico integrador” que recebe a informação do que o pneumologista disse, os dados do cardiologia e do endocrinologista, por exemplo, e que faça depois uma gestão eficiente de todos estes elementos e que acompanhe o doente de forma holística.
A nossa ideia é, portanto, usar ferramentas de inteligência artificial para conseguir descrever melhor estes doentes com multimorbilidade, e conseguir perceber como é que estão a ser tratados, como é que deveriam ser tratados, e qual é o impacto que o tratamento tem nas idas às urgências e internamentos, e fazê-lo de uma forma personalizada.
JN - E de que forma é que se pode vir a implementar? Quais as perspetivas?
FL - Muitas. Para já, tentar perceber que doentes são estes. Através da recolha de dados, ver os clusters mais comuns de doentes, e numa segunda fase analisando os dados e, com a ajuda de algoritmos de inteligência artificial, conseguir definir a terapêutica de sucesso ou prever uma ida à urgência.
Este trabalho é feito pelo HL LH juntamente com uma equipa multidisciplinar de médicos, enfermeiros, gestores e técnicos de saúde, que recolhem e partilham estes dados.
Neste âmbito, vamos fazer um estudo clínico muito interessante, onde vamos testar em doentes com multimorbilidade o efeito de variáveis importantes. Por exemplo, perceber como dormem, o que comem, se dão quedas, qual o efeito da actividade e exercício físico. Ou seja, vamos testar uma série de elementos em 40 doentes e em 40 pessoas saudáveis e procurar que os dados recolhidos nos ajudem a prever algumas situações. Este projeto foi aprovado e estamos já numa fase de recrutamento de doentes.
E esta é a forma como queremos trabalhar, com equipas multidisciplinares e com a realização de estudos clínicos rigorosos produzindo evidência científica.
JN - E que sejam realmente úteis?
FL - Sim. Aliás, temos uma equipa muito interessante aqui na Luz Saúde que se dedica ao estudo dos fatores humanos, como a comunicação e o trabalho de equipa. Esta equipa tenta compreender e reduzir erro e avalia a usabilidade de ferramentas criadas para que, dentro dos workflows existentes, sejam realmente utilizadas e úteis.
A nossa ideia não é estarmos aqui a criar um qualquer protótipo espetacular que depois não vai ter qualquer utilidade, porque é uma caixa negra, ou não está devidamente integrado nos processos.
JN - O 2.º Congresso de Investigação do Hospital da Luz termina com o desafio de “olhar para o futuro”. Qual a perspetiva do HLLH?
FL - Continuar a crescer, continuar a capacitar os nossos investigadores, aumentar o investimento externo e a nossa rede de parceiros. Isto, na investigação de uma forma geral.
Em relação à Inteligência Artificial, estamos empenhados em continuar a crescer não esquecendo a importância do trabalho de equipa, com as áreas clínicas e da engenharia a trabalhar em conjunto, com entusiasmo e motivação.Acho que é o grande objetivo. Este Congresso serve também esse propósito, apresentar a multiplicidade de oportunidades na Luz Saúde e atrair os melhores para trabalharem connosco.
Vamos igualmente continuar a investir em parcerias com várias entidades, privadas e públicas. Portugal é um país tão pequeno que temos de estar de mãos dadas.
JN - A expectativa para o evento é, por isso, bastante animadora?
FL - Certamente. Por todas as razões que já referi, mas também porque temos convidados externos com perfis muito interessantes que vêm partilhar a sua experiência. Por exemplo, na área da investigação, de Vall D´Hebron, ou na área de Dados e do European Health Data Space, da Comissão Europeia.
Em formato presencial ou webinar, valerá a pena acompanhar.