Infeções hospitalares: «Em surtos de MRSA, o uso de técnicas moleculares é de extrema importância»
"Quando estamos perante um surto de staphylococcus aureus resistente à meticilina (MRSA), o que é que nós queremos? É dar resultados rápidos, para evitar cada vez mais a disseminação da bactéria", afirma Maria João Tomás, especialista em Análises Clínicas no Serviço de Patologia Clínica da ULS de Viseu Dão-Lafões.
De acordo com a farmacêutica, é fundamental "darmos um resultado rápido e fidedigno”, salientando que "o uso de técnicas moleculares é de extrema importância e o laboratório tem de estar preparado quer em termos de recursos humanos, quer em termos de stocks e de equipamentos para conseguir dar essa resposta".
Uma preparação antecipada que necessariamente implica "a planificação de todo o processo, colaborando também com outras instituições de saúde, estabelecendo canais frequentes de comunicação".
Maria João Tomás
"Teríamos muito a ganhar com uma maior interação"
Em declarações à Just News, Maria João Tomás salienta que a colaboração entre laboratórios e instituições de saúde pode, de facto, melhorar o diagnóstico e o controlo do MRSA, sendo "fundamental porque permite a partilha de conhecimentos, recursos e estratégias".
Nesse sentido, considera que "devemos estabelecer protocolos de padronização de métodos de diagnóstico e de controlo de qualidade, pois esta partilha é também essencial para a vigilância epidemiológica".
Na sua opinião, "idealmente, os laboratórios centrais devem apoiar as instituições e os hospitais mais pequenos, assim como os cuidados primários, onde um equipamento de fácil manuseamento, como o GeneXpert e a formação adequada, podem fazer toda a diferença".
Considera ainda importante "haver um trabalho na educação e consciencialização dos profissionais de saúde". Ou seja, "acho que teríamos muito a ganhar com uma maior interação entre o laboratório e as diferentes instituições de saúde", afirma.
Experiência da ULS de Viseu Dão-Lafões
A especialista em Análises Clínicas que, na próxima quinta-feira, vai partilhar a sua experiência num webinar intitulado "MRSA: Estratégias Inovadoras para o Controle da Resistência Antimicrobiana", desenvolve um pouco sobre quais são os critérios para a utilização do teste de PCR em tempo real na sua ULS:
"Nós começámos a utilizar o GeneXpert para pesquisa de MRSA a partir de 2023. Desde então, e apesar de querermos cumprir com os critérios descritos na norma da Direção Geral de Saúde, e fazer o rastreio por PCR a todos os utentes na admissão hospitalar, infelizmente ainda não é uma realidade."
Esclarece ainda que a Unidade Local do Programa de Prevenção e Controlo de Infeções e de Resistência aos Antimicrobianos (UL-PPCIRA) definiu que o rastreio por PCR seria feito apenas doentes de determinados Serviços.
Qual então a realidade atualmente na ULS de Viseu Dão-Lafões? "Rastreamos por PCR doentes provenientes do Centro de Referência do Cancro do Reto no Adulto (CRCRA) e doentes que provêm da ortopedia. A todos os outros doentes em que se aplica a norma, a pesquisa é feita através de cultura em meios cromogénicos."
Procedimentos no laboratório: 18 a 24 horas
Para o diagnóstico de MRSA em laboratório, Maria João Tomás indica quais os procedimentos que utilizam: "Na rotina, usamos a cultura em meio cromogénico, o que implica inocular a amostra colhida por zaragatoa nasal, incubar durante 18 a 24 horas a 35±2ºC numa estufa em atmosfera de aerobiose e posteriormente fazer a leitura, que significa verificar se existem colónias cor de rosa ou vermelhas. Na presença de colónias com estas características estamos perante um resultado positivo."
Caso haja dúvidas, "é necessário fazer uma identificação por MALDI-TOF MS para verificar se aquela colónia é de um Staphylococcus aureus e fazer um este imunocromatográfico ou repicar para fazer um TSA".
Já para as amostras com indicação, "fazemos a PCR em tempo real e utilizamos o sistema GeneXpert", afirma. Um equipamento que considera "excelente, porque é compacto e automatiza a extração, amplificação e deteção de DNA. Permite-nos realizar um teste de PCR em tempo real utilizando um manuseamento mínimo da amostra."
E acrescenta: "Basta que façamos a eluição da zaragatoa com a amostra nasal, pipetar diretamente para o cartucho e depois colocá-lo no equipamento. É um processo simples, rápido e preciso."
"A PCR em tempo real é importantíssima"
Questionada sobre quais são as suas principais recomendações com vista a melhorar o diagnóstico de MRSA nos laboratórios, Maria João Tomás salienta, desde logo, que "a adopção de métodos de diagnóstico rápidos e precisos é fundamental. Não devemos ficar pelo menos 18 horas a aguardar por um resultado que venha a ser positivo de MRSA. A PCR em tempo real é importantíssima."
Por outro lado, refere ser "igualmente fundamental fazer uma padronização de protocolos e de programas de controlo de qualidade para garantir a especificidade e precisão dos resultados, fazer formação contínua dos profissionais de saúde e, investir em infraestruturas e tecnologias inovadoras."
"Os antibióticos não são eternos"
Maria João Tomás faz ainda questão de referir que "esta problemática da resistência antimicrobiana é uma problemática que diz respeito a todos nós. Temos de ter consciência de que os antibióticos são uma ferramenta importantíssima e que não são eternos. As bactérias conseguem adaptar-se a tudo e, a uma velocidade mais rápida do que aquela com que nós conseguimos produzir antibióticos novos e eficazes."
A mensagem central é clara: "Temos de fazer um uso racional dos antibióticos para futuramente conseguirmos controlar estas mesmas bactérias."
Organizado pela Cepheid, o webinar que vai contar com a intervenção de Maria João Tomás, realiza-se dia 10 de abril, sendo a inscrição gratuita. A iniciativa é dirigida a "todos os profissionais com interesse no controle da resistência antimicrobiana".

