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«Nós somos melhores clínicos se investigarmos, se discutirmos, se escrevermos»

“Queremos atrair bons profissionais e queremos que saibam que aqui têm espaço para crescer, para fazer investigação”, afirma Marília Cravo, presidente da Comissão de Investigação Clínica da Luz saúde.

Em entrevista à Just News, a médica salienta o “papel crucial” de José Roquette no crescimento de uma “cultura organizacional ímpar” no grupo de Saúde, onde se dá um “forte apoio” à investigação, quer financeiramente, quer através da estrutura de apoio do Hospital da Luz Learning Health.

O grupo Luz Saúde conta atualmente com seis grupos de investigação, “que pretendem ser multiprofissionais, transversais a várias especialidades”, aprovados pela Comissão de Investigação Clínica da Luz Saúde, sendo que quatro desses grupos recebem financiamento desde 2019/2020.
 
Quanto ao 2.º Congresso Nacional de Investigação da Luz Saúde, que se realiza esta setxa-feira, Marília Cravo adianta quais as novidades e porque motivo se trata de um evento tão relevante.


Marília Cravo

Just News (JN) - Quando é que começou a ser promovida a investigação no grupo Luz Saúde?

Marília Cravo (MC) - Julgo que desde o início, muito antes de eu vir trabalhar para aqui o que sucedeu em 2015, pois desde cedo que existem colegas, clínicos, também interessados na Academia, a fazer o seu doutoramento - com grande interesse na investigação científica e em ensaios clínicos. E não foi por ser um grupo privado que esse direito e essa oportunidade não lhes foi dada.

De facto, o anterior presidente da Comissão de Investigação era o professor Roquette e foi ele que começou a desenvolver este trabalho. Quando eu assumi esta responsabilidade, já havia vários grupos constituídos, que tinham projetos sólidos e que, comparando com outros hospitais públicos, faziam um excelente trabalho. Podíamos pensar que por ser um grupo privado, os médicos não teriam tanto interesse ou disponibilidade. Mas não foi e não é o caso.

Havia grupos de investigação, nomeadamente, da Neurologia, da Radiologia, da Cardiologia, que faziam trabalhos de qualidade e doutoramentos que eram apoiados até pela própria Administração. O próprio facto de existir já na altura uma Comissão de Investigação Científica diz muito do empenho do Grupo nesta área.

De facto, o interesse e o apoio à investigação faz parte da cultura organizacional deste grupo. Já havia muitos grupos constituídos, faziam muitos trabalhos, havia doutoramentos, publicavam em revistas internacionais. Por isso, achámos que essa realidade podia e devia ser ainda mais impulsionada. Começámos então a elaborar regulamentos e a estruturar os passos seguintes, para criar uma estrutura sólida e consistente de investigação e inovação no Grupo.

Em 2019, recebemos um financiamento elevado e foram criados quatro grupos de investigação:
- GENIUS – Grupo de Investigação em Patologia Digestiva Luz Saúde,
- LION – Luz Innovation On Neurosciences,
- AIRC – Advanced Imaging Research Consortium,
- VISION – Grupo de Investigação da Visão.

Mais recentemente, apareceram outros dois: WHALE – Women`s Health And Maternal Fetal Research Group e o CRC – Cardiovascular Research Center.

Pretendemos que todos estes grupos sejam multiprofissionais e transversais a várias áreas.




JN - De quanto é o apoio que cada grupo recebe da Luz Saúde? 

MC - Cada grupo tem, durante um período de cinco anos, um financiamento máximo de 30 mil euros por ano.

Sublinho que são financiamentos da própria Luz Saúde, pelo que reforço o importante papel e empenho da Administração do Grupo nesta área. E os resultados estão aí.

Cada Grupo procura aproveitar este apoio para também impulsionar e facilitar o acesso a financiamento externo. No caso do grupo que coordeno, o GENIUS, a médica gatrenterologista Joana Torres já ganhou, por exemplo, uma bolsa de 2 milhões de euros (projeto CROCO) e acabou de receber uma outra de um fundo Europeu no valor de 7 milhões de euros em conjunto com a Prof.ª Salomé Pinho do I3S do Porto .

Neste processo, contamos muito com o apoio do Hospital da Luz Learning Health, que, entretanto, se foi formando, crescendo e dando cada vez mais suporte à investigação desenvolvida por nós. Concorrer aos financiamentos europeus e internacionais é um processo muito complexo, pelo que poder contar com um grupo profissional dedicado a isso é fundamental para o sucesso destes projetos.

Os resultados medem-se, sobretudo, em publicações internacionais, mas também em capacidade para fomentar mais investigação e em trazer para o grupo mais investigação. E isso tem sido conseguido!

Gostaria de salientar que, além desses 6 grupos, foram ainda financiados 20 projetos individuais, também pela administração da Luz Saúde.

Posto isto, não é por acaso que no último relatório da Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência sobre as instituições hospitalares com mais despesa em atividades de Investigação e Desenvolvimento em Portugal, o grupo Luz Saúde apareça em grande destaque, sendo mesmo o grupo privado que mais investe nesta área. É resultado de um investimento muito grande e sinto-me muito orgulhosa com a obtenção destes resultados.

Aproveito para agradecer publicamente à Administração da Luz Saúde, pois este é um investimento de longo prazo, um investimento no futuro da medicina. Sabemos que a investigação não dá logo frutos, mas acabará por resultar algo bom para todos nós, médicos, doentes, e para a sociedade em geral.

JN - Que nível de colaboração têm com outras entidades? É algo que procuram fomentar?

MC - Sim, sem dúvida. Por exemplo, temos agora um projeto, que é internacional, no âmbito do tumor do reto. Muitas vezes, para os doentes serem tratados, podem ter de viver com uma colostomia. Acontece que, desde há uns 10 anos, se identificou que há um grupo de doentes que responde muito bem ao tratamento e que o tumor desaparece com quimioterapia e radioterapia. Estamos agora a tentar identificar os marcadores, nestes doentes, de forma a podermos tratar com quimio e radioterapia, e fazer desaparecer o tumor sem haver necessidade de uma cirurgia mutilante, que é ficar com uma colostomia.

Este foi um convite feito por colegas de outros Hospitais mas o inverso também ocorre, naturalmente. Convidámos colegas de várias entidades para participar connosco em estudos, como o do CROCO da Prof Joana Torres.



JN - Relativamente ao 2.º Congresso de Investigação do Hospital da Luz, que se realiza esta sexta-feira, uma das novidades é que estará aberto a todos os profissionais interessados em investigação, inclusive fora do grupo Luz Saúde, certo?


MC - Sim. No ano passado sentimos que era quase uma obrigação realizar o 1.º congresso, dado o financiamento que tínhamos tido. Quisemos apresentar publicamente os resultados que estávamos a ter. E foi muito bom. Todos os nossos colegas, que vieram assistir e ficaram a conhecer os nossos projetos, ficaram surpreendidos! Assim, no ano passado o objetivo foi, sobretudo, transmitir o que estamos a fazer com os apoios financeiros que temos recebido todos os anos do Grupo Luz Saúde… e que não é pouco.

Enquanto presidente da Comissão de Investigação, achei que tínhamos de mostrar esses resultados à Administração da Luz Saúde, mas também, e sobretudo, aos colegas dos nossos hospitais. É nossa obrigação sermos transparentes e explicar que estamos a ampliar o projeto, recorrendo a outros financiamentos e dando a conhecer as nossas publicações. E parece-me que esse objetivo foi conseguido.

Já este ano, abrimos mais a porta. Queremos que, não só dentro do Grupo, se fique a conhecer o que estamos a fazer. Ser completamente transparente para toda a comunidade e de saúde.

Mas não só. Convidamos também oradores com grande experiência em áreas como a ciência de dados, a inteligência artificial e o European Health Data Space, pelo que vamos ter palestras extremamente interessantes.



JN - Uma das mesas redondas do programa será dedicada ao exemplo de Vall D`Hebron, em Barcelona. Como e porquê surgiu a ideia desta partilha?

MC - Tanto o professor José Passos Coelho como o professor José Roquette visitaram há uns anos essa unidade hospitalar e perceberam como se deu todo o desenvolvimento do centro, que deixou de ser um centro puramente clínico para passar a ser também um centro de investigação de ponta.

Para que tal se concretizasse, houve investimento de laboratórios, de centros privados e públicos, de universidades… Hoje são um grande centro de investigação e continuam a tratar os doentes. E, não menos importante, provavelmente até tratarão agora melhor os doentes, do que quando não tinham investigação. Porque, quando ficamos limitados à clinica, não crescemos tanto e não aprendemos tanto como quando fazemos mais.

Esta sessão, intitulada “How did Vall D`Hebron become what it is today?”, será moderada precisamente pelos professores José Passos Coelho e José Roquette. O orador convidado é Alejandro Piris, responsável pela área de coordenação/gestão científica do Vall D`Hebron Institute of Oncology (VHIO).

Numa outra mesa redonda, vamos abordar um tema igualmente muito relevante: como obter mais financiamento de entidades externas e internacionais para a investigação. Porque é para isso também que deve servir o apoio do HL Learning Health: para nos dar acesso a esse financiamento. E devo acrescentar que a criação e a implementação desta estrutura, a Learning Health, tem sido fundamental para conseguirmos concorrer a esses fundos externos.
 
JN - O programa contempla a apresentação de trabalhos. Também aqui procuram, de alguma forma, fomentar a construção de pontes e de sinergias?


MC - Vamos ter vários vários trabalhos que estão a ser desenvolvidos por profissionais de saúde com a colaboração de engenheiros, e vice-versa. Um deles, um trabalho de inteligência artificial sobre diverticulites, é feito por uma cirurgiã, com a colaboração de um engenheiro de dados.



JN - Esta visão da instituição em apoiar a investigação acaba por ser muito atrativa para vários profissionais?

MC - Exatamente. Nós queremos atrair pessoas boas e, por outro lado, queremos que saibam que têm espaço para crescer, para receber e dar feedback em reuniões, para fazer investigação. Por exemplo, está agora a trabalhar connosco uma colega que fez a sua formação no IPO, e que veio para cá porque vai poder fazer o doutoramento connosco. Aqui, ela pode ter tempo para dedicar à investigação, para fazer o seu projeto de doutoramento e isso atrai pessoas com muito talento e muito empenhadas no que fazem.

Acredito realmente que nós somos melhores clínicos se investigarmos, se discutirmos, se ajudarmos, se escrevermos, se nos candidatarmos a projetos.

 

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