O desenvolvimento de redes de referenciação «é decisivo para combater as doenças do coração»
“A formação dos médicos de família e a sua afiliação aos especialistas da área da Cardiologia podem ser ações decisivas para melhorar o diagnóstico precoce das doenças do coração.” As palavras são de Manuel Delgado, secretário de Estado da Saúde, e foram proferidas na Reunião anual do Grupo de Estudo de Doenças do Miocárdio e do Pericárdio (GEDMP) e I Reunião Ibérica de Miocardiopatias.
Aquele responsável dirigia-se aos que se encontravam presentes no evento, incluindo quem partilhava consigo a mesa de abertura, nomeadamente, Luís Rocha Lopes, coordenador do GEDMP, Miguel Mendes, presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, e Roberto Barriales-Villa, coordenador do Grupo de Trabalho de Cardiopatias Familiares da Sociedade Espanhola de Cardiologia.
O secretário de Estado da Saúde considera que a prevenção primária e secundária são também “tarefas prioritárias”. Segundo disse, nesta área, ”o esforço da literacia e da informação persistente aos cidadãos tem dado os seus frutos”.
O responsável apontou ainda “a existência e desenvolvimento de redes de referenciação e a definição dos pontos de rede com capacidade resolutiva” como “questões decisivas”.
Lançar o debate sobre a criação de uma rede nacional de referenciação na área das miocardiopatias
Luís Rocha Lopes, que coordena o GEDMP desde 2013, salientou o facto de, pela primeira vez, se realizar uma Reunião Ibérica em simultâneo com a Reunião Anual do Grupo, mencionando ter expectativas de que seja um acontecimento que tenha continuidade.
O especialista, que além de consultor de Cardiologia no Barts Heart Centre, St. Bartholomew’s Hospital, em Londres, é senior lecturer na University College London e professor auxiliar de Cardiologia da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, aludiu à presença de colegas argentinos, mexicanos e brasileiros, além, obviamente, de espanhóis, tornando, na verdade, esta reunião “quase ibero-americana”.
Foram apresentados os principais temas da reunião, incluindo o lançamento do debate sobre a criação de uma rede de referenciação na área das miocardiopatias. Outros temas anunciados e focados na reunião foram: as etiologias específicas que causam insuficiência cardíaca de fração de ejeção preservada; os novos e futuros tratamentos para formas específicas de miocardiopatia; as áreas cinzentas no diagnóstico e a melhor forma de evitar iatrogenia e as miocardiopatias na perspetiva dos genes.
Interagir com outras especialidades
Em jeito de balanço dos dois biénios como coordenador do GEDMP, Luís Rocha Lopes mencionou que foram realizadas quatro reuniões científicas anuais, tendo-se procurado, em todas, abrir o leque de interação com outras especialidades que considera que “podem ser muito importantes na área das miocardiopatias”, como a Genética, a Anatomopatologia, a Oncologia, a Neurologia e a Medicina Desportiva e também com investigadores de ciências biomédicas, da área da genética e não só.
Salientou também a realização de uma reunião conjunta com o Grupo de Estudo de Cardiologia Nuclear, Ressonância Magnética e TC Cardíaca (GECNRMTC), em 2014, e a participação muito ativa do Grupo de Estudo nas várias edições do Congresso Português de Cardiologia da SPC, quer em mesas-redondas, quer noutras sessões e na contribuição para a sugestão e convite de palestrantes internacionais.
Luís Rocha Lopes frisou que, durante este tempo, foi publicada uma newsletter com uma periodicidade mais ou menos bimensal e foram lançados livros para doentes e famílias com miocardiopatias. Foram ainda iniciados dois novos Registos Nacionais, de miocardiopatia arritmogénica e ventrículo esquerdo não compactado e muito ativamente promovida a participação dos sócios da SPC e membros do GEDMP nos Registos já em curso (miocardiopatia hipertrófica, miocardites e miocardiopatia de takotsubo), cujos resultados foram sendo divulgados nas várias reuniões do GEDMP, tal como aconteceu nesta edição de 2017.
Outra das novidades foi a criação do Prémio do Grupo Estudo de Doenças do Miocárdio e do Pericárdio/AstraZeneca, que visa promover a investigação científica na área das doenças do miocárdio e pericárdio, que teve a sua primeira edição em 2016 e que foi atribuído no último Congresso da Sociedade Portuguesa de Cardiologia.
Roberto Barriales, Luis Rocha Lopes, Manuel Delgado e Miguel Mendes.
SPC quer investir no registo das patologias raras
Por seu lado, Miguel Mendes, presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, elogiou o trabalho desenvolvido pelo GEDMP nos últimos quatro anos, tendo salientado o seu contributo para a promoção do estudo, conhecimento e formação dos cardiologistas portugueses nesta área.
O diretor do Serviço de Cardiologia do Hospital de Santa Cruz salientou a qualidade das reuniões científicas anuais, a existência de uma newsletter regular e de “elevada qualidade” e dos registos e agora este “abrir de portas” para o resto da Península Ibérica que, na sua opinião, “vai certamente potenciar o trabalho e a qualidade daquilo que pode ser desenvolvido no futuro próximo”.
Saudando Roberto Barriales-Villa, coordenador do Grupo de Trabalho de Cardiopatias Familiares da Sociedade Espanhola de Cardiologia, Miguel Mendes fez referência às “relações histórias” entre as direções das sociedades portuguesa e espanhola, afirmando ser “uma grande felicidade” que também ao nível dos grupos o trabalho esteja a funcionar de forma articulada.
O presidente aproveitou para agradecer a abertura que tem havido por parte do Ministério da Saúde em relação à SPC, afirmando que tem sido muito importante encontrar “portas abertas”. A título de exemplo, salientou o trabalho desenvolvido com a DGS no âmbito do Registo Nacional de Cirurgia Cardíaca.
Desenvolvendo um pouco mais o trabalho feito na área dos registos, Miguel Mendes afirmou: “Ao longo destes anos, temos desenvolvido registos em várias áreas que têm permitido o estudo e reconhecimento da realidade nacional em muitos campos.”
“Vivemos num tempo em que estamos a ter patologias raras e é muito importante que estas estejam registadas, não só pelo conhecimento e investigação, mas, porventura, porque será a melhor forma de podermos controlar a disponibilização de fármacos caros. Estando todos os casos registados e integrados num registo transparente, será possível organizarmos o tratamento e a abordagem desses doentes e fazê-lo de uma forma controlada e articulada a nível nacional”, referiu. E acrescentou:
“A SPC disponibiliza-se a continuar este trabalho em colaboração com o Ministério da Saúde e, de alguma forma, gostaríamos que estes registos fossem mais profissionalizados no sentido de se tornarem um pouco mais obrigatórios. Agora são preenchidos voluntariamente, mas, pelo menos nos casos de patologias raras com terapêuticas caras, deveriam, na nossa opinião, ser de preenchimento obrigatório. Só isso é que permitiria o acesso aos tratamentos inovadores e caros que vêm por aí”, apontou.
A Comissão Organizadora do evento foi constituída pelo coordenador do GEDMP, Luís Rocha Lopes, pelos seus vogais Emanuel Correia e Olga Azevedo, por Nuno Marques, do Centro Hospitalar do Algarve, e Roberto Barriales-Villa.
Nuno Marques, Roberto Barriales, Luis Rocha Lopes, Olga Azevedo, Miguel Mendes e Emanuel Correia.
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