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Obstetrícia de Santa Maria: «forte interação» com outras especialidades é uma mais-valia

Em janeiro de 2019, quando Diogo Ayres de Campos assumiu a direção do Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte (CHULN), trouxe um pouco do seu cunho pessoal àquele que considerava ser já “um Serviço com largos anos de tradição, com uma equipa de saúde muito forte”.

Com uma forma de organização resultante de mais de 20 anos de experiência na área, procurou valorizar sobretudo a disseminação da informação, criando ficheiros partilhados acessíveis a toda a equipa.

“Dessa forma, todos conseguimos aceder aos contactos dos profissionais, à programação das atividades clínicas, ao calendário das reuniões, ao mapa de férias, à agenda das aulas e até às contingências decorrentes da pandemia covid-19”, ilustra, destacando que esta partilha foi “fundamental para manter a equipa alinhada, sobretudo nos primeiros meses da pandemia”.


Diogo Ayres de Campos

Na mesma ótica, tem vindo a trabalhar na elaboração de protocolos clínicos do Serviço, contando-se já mais de uma centena, no sentido de uniformizar atitudes e procedimentos.

Ao mesmo tempo, privilegia “ouvir os profissionais de saúde e dar-lhes a oportunidade de exprimirem as suas opiniões, para que possa ser tomada uma decisão mais equilibrada”.

Uma "forte interação" com várias especialidades

Diogo Aires de Campos apostou também na dinamização de várias iniciativas, como cursos pós-graduados de monitorização fetal intraparto, manobras obstétricas básicas, emergências obstétricas, versão cefálica externa ou patologia renal na gravidez. Alguns destes cursos foram por ele fundados no Hospital de São João, onde era especialista até integrar este Serviço, em 2017.

Na sua ótica, “é preciso assegurar que a equipa se mantenha atualizada e que a prática clínica vá evoluindo ao longo do tempo, principalmente num hospital universitário, que tem tanta responsabilidade no ensino pré e pós-graduado e que é centro de referência em diversas áreas”.

No caso específico do Serviço que dirige, destaca a "forte interação" com várias especialidades, em particular, a Cardiologia, a Endocrinologia, a Reumatologia, a Nefrologia, a Radiologia ou a Genética. Uma dinâmica que tem vindo a ser reforçada e que considera ser algo altamente benéfico para a grávida.



O exemplo da Reumatologia: desde o acompanhamento pré-concecional 

Tendo as doenças reumáticas um envolvimento articular significativo, “por vezes atingem outros órgãos e sistemas”, explica à Just News a reumatologista Susana Capela

Caracterizadas por atingirem com maior prevalência o sexo feminino, principalmente em idade fértil, sabendo que “podem existir algumas complicações na grávida, tanto a nível materno como fetal, é fundamental existir um seguimento e uma orientação no sentido de termos uma gravidez de sucesso”.

Podendo frequentemente assistir-se ao agravamento da doença de base, Susana Capela considera muito importante “avaliar as doentes conjuntamente com a Obstetrícia numa fase pré-concecional e ter a doença estável e, idealmente, em remissão nos seis meses anteriores à conceção”.



Dado que alguns dos fármacos utilizados podem provocar malformações no feto, a recomendação é sempre para “existir um ajuste da medicação, por forma a compatibilizá-la com a gravidez”. O objetivo durante o ciclo de gravidez será sempre “controlar ao máximo a atividade da doença, reduzindo a probabilidade de se darem casos de restrição de crescimento fetal ou de partos pré-termo”. A reumatologista realça a importância de existir um acompanhamento multidisciplinar, recebendo indicações da Obstetrícia quanto ao bem-estar fetal.

Sabendo-se que cerca de metade das gravidezes neste leque de doentes não é planeada, Susana Capela adianta que pode ser necessário iniciar terapêutica imunossupressora ou biotecnológica durante a gravidez. Destacando a evolução que se tem feito sentir nesta área, a reumatologista salienta que, “se anteriormente várias mulheres com doenças reumáticas graves não tinham possibilidade de engravidar, atualmente, conseguem-se gravidezes de sucesso”.

No pós-parto, é tempo de “ajustar devidamente a medicação e delinear um plano para o futuro”.



"Contribuir para o progresso da ciência"


Diogo Ayres de Campos acredita que os hospitais universitários têm um papel importante na disseminação dos avanços na prática clínica e que essa deve ser uma das suas vocações. “Não podemos viver só da inovação criada no estrangeiro, mas devemos contribuir também, nós próprios, para o progresso da ciência”, refere.

Esta é uma prática que tem potenciado através da criação de grupos de investigação autónomos, e o Serviço tem publicado anualmente cerca de duas dezenas de artigos científicos em revistas internacionais indexadas na Medline.


No seu entender, a sua ligação ao European Board and College of Obstetrics and Gynaecology (EBCOG) desde 2009, onde fez muitas visitas de idoneidade a hospitais europeus, “contribuiu em muito para perceber a forma como os serviços estavam organizados e reter as suas boas práticas”.


Elementos da equipa de Obstetrícia

O propósito de responder às diferentes expectativas das grávidas

Entendendo que “as pessoas são todas diferentes e é esta diversidade que torna a espécie humana tão interessante”, ao longo do seu percurso profissional, Diogo Ayres de Campos tem procurado “respeitar as grávidas nas suas diferenças, na diversidade das suas características e das suas expectativas”.

Referindo-se concretamente às diferentes expectativas que colocam no trabalho de parto, afirma que a prática no Serviço é “tentar, dentro do possível, ir ao encontro delas, proporcionando uma experiência positiva naquele que é um dos momentos mais importantes da vida de uma mulher e da sua família”.



A segurança, no entanto, é para si um elemento major, defendendo que “ninguém vive uma experiência de parto positiva se o desfecho materno ou fetal for adverso”. Por isso, “uma vez assegurado este aspeto da segurança, adaptamo-nos bem às expectativas”.

Esta adequação é ainda mais importante face às diversas culturas que existem em Lisboa, sendo comum o contacto com mulheres de origem africana, indiana e paquistanesa. Respeitando as diferenças que existem entre as grávidas, a atuação é sempre baseada numa “decisão clínica partilhada”.

A título de exemplo, o obstetra adianta que, perante uma apresentação pélvica que ocorre próximo do termo da gravidez, é fornecido à grávida um folheto informativo com as vantagens e desvantagens das diversas alternativas: a versão cefálica externa, o parto pélvico e a cesariana programada. “Procura-se encontrar com a grávida a solução que mais se ajusta à situação, às características culturais e às suas expectativas”, destaca.



Para si, a vigilância da gravidez e a assistência ao parto em mulheres de classe económica mais elevada e com maiores conhecimentos de saúde, que anteriormente não procuravam cuidados de saúde em hospitais públicos, traduz uma maior atratividade do Serviço também para esta população.

Durante a pandemia de covid-19, mantiveram sempre a possibilidade de acompanhamento durante o trabalho de parto e as visitas hospitalares posteriores à mãe e recém-nascido, à exceção do mês de março de 2020, em que tal foi suspenso pelo desconhecimento que então imperava sobre a transmissibilidade da infeção.

Na sua opinião, esta opção terá tido algum peso na manutenção do número anual de partos durante os anos de 2020 e 2021, ao contrário do que se verificou noutras instituições. A necessidade de investir em condições hoteleiras

A deambulação e a possibilidade de recurso a bolas de pilates são práticas comuns, neste Serviço, durante o trabalho de parto. No entanto, Diogo Ayres de Campos considera que as condições das salas de parto poderiam ser muito melhores.

“Além de chuveiros individuais e banheiras de imersão para a fase da dilatação, gostaríamos de oferecer às parturientes um ambiente menos hospitalar, sem que isso significasse o acesso a menos tecnologia – ou seja, é necessário guardar a tecnologia em locais menos visíveis, mas acessíveis quando necessário”, evidencia.


Diogo Ayres de Campos: “A minha filosofia é procurar ajudar as grávidas e as suas famílias a cumprirem as suas expectativas, dentro de todas as vertentes da saúde, que englobam as componentes física, psicológica, emocional e social.”

Também ao nível das enfermarias de pós-parto, altura das primeiras interações e cuidados ao recém-nascido, onde pode existir alguma ansiedade e cansaço, é ambição da equipa criar quartos individuais com casas de banho privativas, para garantir maior privacidade, conforto e resguardo do descanso.


“Penso que há muitos casais a escolher o sistema privado apenas por causa das condições hoteleiras, que atualmente consideramos básicas, mas que, infelizmente, ainda não existem na maioria dos hospitais do SNS”, observa.

Nesse sentido, estão a ser desenhadas novas plantas e a decorrer candidaturas a financiamentos para que se criem melhores condições hoteleiras, que o diretor de Serviço entende que “em 2021 deveriam já ser standard para todo o país”. O objetivo é fazer-se uma extensão por cima da Urgência Pediátrica. A vertente de ambulatório será também centralizada no mesmo local. Já a Urgência e o Bloco de Partos ficarão contíguas, para otimizar os recursos humanos.

“Temos uma articulação muito forte com a Ginecologia”


Sendo o Serviço de Obstetrícia uma parte integrante do Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução do CHULN, ao qual pertence também o Serviço de Ginecologia, Diogo Ayres de Campos "não poderia deixar de destacar a importante ligação entre os dois", indicando que realizam reuniões conjuntas duas vezes por semana, "uma sobre artigos científicos e outra sobre temas clínicos de interesse comum".

Paralelamente, admite que a articulação com o Serviço de Ginecologia é também importante para o tratamento cirúrgico da gravidez ectópica e do acretismo placentário, para o qual são um centro de referência. “Temos uma equipa específica dedicada ao acretismo placentário, constituída por obstetras, ginecologistas, anestesiologistas e radiologistas”, refere.





A reportagem completa ao Serviço de Obstetrícia do CHULN, que inclui entrevistas a mais de duas dezenas de profissionais deste e de outros serviços, pode ser lida no jornal Hospital Público de setembro/outubro 2021.

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