Qual o real impacto dos determinantes sociais na saúde mental? «É basilar ter este diagnóstico»

"A literatura evidencia que cerca de 70% dos resultados em saúde referem-se aos determinantes sociais", salienta Inês Espírito Santo, professora auxiliar convidada do ISCTE-IUL e membro da Direção da Associação dos Profissionais de Serviço Social (APSS).

Em declarações à Just News, sublinha, por isso, "a necessidade de aumentar o conhecimento nesta área e serem pensadas intervenções multidisciplinares e multissetoriais que considerem essas variáveis".


Inês Espírito Santo

Na sua opinião, "o panorama atual exige que os profissionais que atuam em saúde estejam preparados para enfrentar os desafios impostos pelas desigualdades sociais, muitas vezes exacerbadas por fatores que se relacionam com as desigualdades de acessos, quer aos setores económicos quer a políticas públicas".

E, "olhando para o futuro", considera ser "essencial continuar a investir na capacitação profissional e na criação de políticas públicas que priorizem intervenções preventivas, equitativas e multidisciplinares".

Inês Espírito Santo, que integra a Equipa Coordenadora Nacional na área do Serviço Social (ECNSS), aprovada pela anterior Direção Executiva do SNS, acrescenta ainda:

"A integração dos determinantes sociais da saúde nas intervenções deve ser aprofundada e sistematizada, de forma a mitigar as desigualdades que afetam diretamente as pessoas. O mapeamento dos serviços da comunidade, a criação de ferramentas de rastreio e o aumento do conhecimento dos profissionais de saúde sobre o impacto dos determinantes sociais, são apontadas como boas práticas sustentadas no desenvolvimento socioeconómico da comunidade."

Inquérito disponível até 30 de novembro

Precisamente com o propósito de proporcionar mais dados robustos e atuais sobre o real impacto dos determinantes sociais na saúde mental, Inês Espírito Santo e Patrícia Pinto estão a realizar um trabalho de investigação no ISCTE sobre "Determinantes Sociais na Saúde Mental".

O processo de pesquisa procura "compreender a forma como fatores relacionados com o poder económico, educação, emprego, habitação, rede de apoio social e acesso aos serviços de saúde impactam no bem-estar e na saúde da pessoa".

Através do inquérito que está online desde agosto, e disponível até dia 30 de novembro, o objetivo é "ter uma análise abrangente sobre o impacto dos determinantes sociais na saúde e na saúde mental portuguesa", explica Patrícia Pinto.

Esclarece também que "o estudo integra questões de âmbito multidimensional, com recurso a variadas escalas, com a pretensão de identificar padrões e associações entre os determinantes sociais e o estado de saúde da população nacional".

A convicção é que os resultados deste estudo, que se realiza no âmbito do Doutoramento em Serviço Social por parte de Patrícia Pinto, sob a orientação de Inês Espírito Santo, contribuirão para "um amplo conhecimento científico de um tema tão relevante que permitirá sustentar propostas e estratégias de âmbito nacional e territorial".

Inês Espírito Santo considera mesmo que "os resultados serão como ´uma oportunidade`, na saúde, por facilitar a tomada de decisão com base na evidência, numa altura de grande transformação do SNS, em que se preconiza a integração de cuidados e o trabalho de proximidade junto do cidadão e ter este diagnóstico é basilar!!"


Inês Espírito Santo e Patrícia Pinto

Dados que permitem desenvolver "estratégias adaptadas às realidades locais"

De acordo com Patrícia Pinto, esta investigação irá "proporcionar dados detalhados e específicos sobre o contexto português. Pois, embora existam um aumento de investigações sobre os determinantes sociais da saúde e da saúde mental, em Portugal os estudos são escassos, e ou inexistentes".

Lembrando que a realidade portuguesa tem "particularidades culturais, económicas e sociais que exigem uma análise e compreensão", salienta que este estudo pode revelar "novas correlações entre a saúde e fatores como o poder económico, emprego, educação, habitação e redes de apoio".

Inês Espírito Santo partilha do entusiasmo e afirma: "Estamos expectantes quanto aos dados da pesquisa que podem contribuir para propor ações que melhorem os resultados em saúde!"

Na sua opinião, poderá "evidenciar ou não disparidades regionais ou socioeconómicas que afetam a saúde de forma diferenciada, atendendo, por exemplo, à área geográfica, níveis de escolaridade ou diferentes oportunidades de acesso aos serviços de saúde". Dados que serão muito relevantes, pois permitem "não só o desenvolvimento de estratégias adaptadas às realidades locais, mas também a identificação de lacunas que podem ser preenchidas com políticas públicas e ou planos mais direcionados a determinados grupos e ou territórios."

A partir dos resultados obtidos será, assim, "possível propor intervenções mais equitativas e específicas, que considerem tanto as vulnerabilidades quanto as potencialidades das diferentes comunidades".

E, "acima de tudo", manifesta o desejo de que com este trabalho seja depois possível "propor medidas de base populacional/território, que envolvam diferentes stakeholders da área da saúde, das associações, das autarquias e outros, de acordo com as necessidades identificadas e que preconize a promoção da saúde, prevenção de doenças, diagnóstico, tratamento, gestão de doença e promoção da literacia".

O contributo do assistente social para "uma crescente valorização da abordagem holística"

Inês Espírito Santo aproveita para destacar o papel e campo de atuação do assistente social na saúde e na saúde mental:

"Verificamos que este profissional tem contribuído para uma crescente valorização da abordagem holística, atenta da pessoa e do seu contexto. Pela sua formação, os assistentes sociais são preparados para atuar de forma integrada, através de intervenções abrangentes e reconhecedoras da história de vida dos utentes, tendo em conta o seu contexto e recursos."

Na perspetiva da "intervenção centrada na pessoa, reconhecida por diferentes autores como a mais eficaz em psiquiatria e saúde mental", salienta ser "fundamental olhar para a pessoa como um todo, reconhecendo as suas potencialidades, fragilidades e, acima de tudo, o seu contexto de vida".

Sabendo que "cada utente traz consigo uma história e uma rede de relações que influencia diretamente a sua saúde mental", refere que, por isso, "a intervenção deve ser construída de forma colaborativa, envolvendo a pessoa no processo de decisão e criando um plano que considere as suas necessidades e prioridades, quer estejam estas relacionadas com a sua vida pessoal, familiar ou comunitária".

Mensagem final? "Os determinantes sociais da saúde mental, que incluem os fatores como a participação social, condições económicas, acesso e condições de habitação, educação e políticas públicas, desempenham um papel crucial nos resultados em saúde."

O questionário pode ser preenchido aqui, podendo participar "todas as pessoas com idade igual ou superior a 18 anos e que residam em Portugal, incluindo as regiões autónomas dos Açores e da Madeira". A participação é voluntária e confidencial.

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