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«Todos têm um papel na melhoria do acesso ao medicamento e do seu circuito»

“Gerou-se o consenso de que há pequenos passos que podem ser dados por cada agente, seja o médico, a empresa farmacêutica, o distribuidor, ou o farmacêutico, para melhorar o acesso da população ao medicamento”, refere Maria do Céu Machado, presidente da Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa (SCML), em declarações à Just News.

“Acesso ao Medicamento: constrangimentos e soluções” foi o mote do evento organizado por esta Sociedade, no início da última semana, na Faculdade de Farmácia da Universidade de Lisboa.



Em dois painéis, que contaram com a participação de “todos os responsáveis pelo circuito do medicamento” - representantes de associações de doentes, médicos, farmacêuticos hospitalares e da comunidade, empresas farmacêuticas, distribuidores, e ainda da Ordem dos Médicos, da Ordem dos Farmacêuticos, do INFARMED, da Comissão Nacional de Farmácia e Terapêutica, da Associação Portuguesa da Indústria Farmacêutica e dos Serviços Partilhados do Ministério da Saúde -, identificaram-se problemas e discutiram-se soluções.


Beatriz Lima, diretora da FFUL, e Maria do Céu Machado

Maria do Céu Machado distingue que houve uma grande conclusão retirada do debate: “A responsabilidade não é só da empresa farmacêutica, que define preços muito elevados, ou do médico, que não prescreve por Denominação Comum Internacional. Todos têm um papel na melhoria do acesso ao medicamento e do seu circuito.” 


“Há áreas em que é preciso avançar mais depressa”


A professora catedrática jubilada da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa destaca terem sido identificadas “áreas em que é preciso avançar mais depressa, como a da dispensa de medicamentos hospitalares em unidades de proximidade, que ainda não está em funcionamento”.

A profissional realça a necessidade urgente desta implementação, de forma que “em situações de insuficiência hormonal ou doença oncológica cuja terapêutica seja oral, o doente de Faro ou das Caldas da Rainha, por exemplo, escuse de se deslocar a Lisboa uma vez por mês para levantar a terapêutica, perdendo o dia de trabalho e o valor da viagem, passando a recebê-la na sua farmácia comunitária, o que se traduz num ganho fabuloso”.


Relativamente aos concursos para compra centralizada de fármacos, houve espaço para abordar “as exigências que têm vindo a dificultar as candidaturas, como a necessidade de disporem de um elevado número de embalagens de medicamentos, quando poderão não ganhar o concurso, representando um desperdício”.

Pelo facto de estes processos terem um “timing muito curto, tem sido difícil para as empresas candidatar-se, levando a que vários concursos da SPMS fiquem vazios”.


Por outro lado, foi tratado ainda o desperdício relacionado com a morte de doentes crónicos. Como explica, “muitas vezes, pelo medo que têm de que a sua medicação esgote, os doentes acabam por açambarcar e ter verdadeiras farmácias em casa. Tal leva a que, frequentemente, acabem por ter medicamentos fora de prazo ou, dentro do prazo, que, de acordo com a legislação europeia, não poderão voltar à farmácia”.


Nesse sentido, “seria necessário adotar estratégias que evitassem que tanta gente não consiga comprar medicação quando outros têm um verdadeiro manancial em casa”. A dispensa de medicação pelo farmacêutico para dois meses, por exemplo, foi uma das ideias discutidas, que “poderia contribuir para evitar o desperdício e a falha de medicamentos básicos por açambarcamento”.



“É muito difícil para os países que integram um SNS introduzirem medicamentos inovadores e fixarem preços”

A exportação de medicamentos foi outra das temáticas em debate, notando Maria do Céu Machado que “o preço baixo dos medicamentos em Portugal leva a que seja difícil para os distribuidores resistirem a exportar uma percentagem tão grande”.

No entanto, “a revisão dos preços, neste momento, tem grande complexidade do ponto de vista social, pois fatores como a inflação e a guerra têm colocado muitas famílias numa situação frágil, levando a que a abordagem destes temas exija uma visão muito global”.

Neste âmbito, discutiu-se ainda a nova legislação europeia, que, “por um lado, vai potenciar a produção centralizada, encurtando o tempo de introdução de medicamentos inovadores no mercado. Contudo, após determinado período de tempo cada país pode fixar um preço, e Portugal, tendo alguma dívida às empresas farmacêuticas e um problema de sustentabilidade do SNS, não poderá praticar preços muito altos”.

A presidente da SCML ressalva que “para os países que integram um Serviço Nacional de Saúde é muito mais difícil introduzirem medicamentos inovadores no mercado e fixarem os respetivos preços do que para países cuja base do Sistema de Saúde são seguradoras, como acontece na Alemanha, em que não é o Estado que paga a inovação, pelo que é-lhe indiferente se o medicamento já está no mercado e a ser prescrito, ou não”.

Pelo contrário, “quando essa responsabilidade é do SNS, a matéria complexifica-se, porque este tem de ter sustentabilidade para garantir equidade no acesso à medicação”.



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