«A utilização de testes moleculares multiplex para infeções respiratórias trouxe ganhos significativos»

De acordo com Raquel Marques, coordenadora do Laboratório de Biologia Molecular da ULS Almada-Seixal, "a utilização de testes moleculares multiplex trouxe ganhos significativos em três áreas fundamentais: eficiência, precisão e impacto clínico". 

A assistente hospitalar graduada é uma dos oradoras convidadas para a mesa redonda que se realiza dia 9 de outubro, em formato online e dedicada ao tema: “Vigilância, prevenção e tratamento dos vírus respiratórios: Uma abordagem integrada”, onde será precisamente abordado este tema.

Detetar o vírus "mesmo com cargas virais baixas"

Em termos de eficiência dos testes moleculares multiplex, Raquel Marques destaca a "redução do tempo de resposta, a necessidade de apenas uma colheita para testar múltiplos vírus e a otimização do fluxo laboratorial, com menor consumo de reagentes e maior rendimento por teste".

No que toca à precisão, afirma que "a PCR em tempo real é considerada o gold standard pela sua elevada sensibilidade e especificidade". Esclarece ainda que "os painéis multiplex permitem identificar com fiabilidade o vírus presente, mesmo com cargas virais baixas, e detetar coinfeções, algo particularmente relevante em grupos vulneráveis como crianças, idosos e imunocomprometidos."

Quanto ao impacto clínico, refere que "é igualmente relevante". E desenvolve a ideia: "um diagnóstico rápido permite isolar e tratar adequadamente os doentes, prevenir surtos hospitalares, orientar a terapêutica antiviral e evitar o uso desnecessário de antibióticos, contribuindo para o combate à resistência antimicrobiana. Além disso, facilita a gestão de camas e recursos hospitalares, agrupando doentes com o mesmo vírus e otimizando o fluxo nas urgências."

Em jeito de conclusão, considera que "os testes multiplex transformaram o diagnóstico laboratorial numa ferramenta essencial de gestão clínica, permitindo respostas mais rápidas, seguras e eficientes à circulação dos vírus respiratórios".


Raquel Marques

"A descentralização traz desafios"

Para Raquel Marques, não há qualquer dúvida de que "há um espaço significativo e clinicamente relevante para expandir o uso dos testes moleculares multiplex para fora do ambiente hospitalar".

E considera que esta expansão pode "melhorar a gestão de infeções e o controlo de surtos, especialmente em instituições como lares, centros de saúde e unidades de cuidados continuados, ajudando a evitar a sobrelotação hospitalar".

No entanto, destaca que "a descentralização traz desafios, sobretudo na garantia da qualidade e rastreabilidade dos testes". Nesse sentido, adverte que, "para que seja segura e eficaz, é essencial implementar um sistema robusto de governança laboratorial, assegurando que os mesmos padrões técnicos sejam mantidos em todos os pontos de testagem".

Refere ainda que, "apesar dos riscos operacionais, como armazenamento inadequado, gestão de stocks e manuseamento de amostras, é possível implementar este modelo com sucesso, desde que o controlo continue sob responsabilidade do laboratório hospitalar".

Segundo Raquel Marques, esta abordagem pode "reduzir custos com internamentos e permitir o isolamento domiciliário de doentes, desde que haja formação adequada para os próprios e para os seus cuidadores. Em suma, a expansão da testagem para fora do hospital é desejável, mas deve ser feita com rigor, cuidados técnicos e garantia de qualidade."

Uma ferramenta que permite "desbloquear rapidamente o fluxo hospitalar"

Questionada sobre que mensagem gostaria de deixar a decisores e gestores hospitalares sobre o investimento em diagnósticos laboratoriais de qualidade, Raquel Marques começa por salientar que "a precocidade diagnóstica é um pilar estratégico na gestão hospitalar, especialmente durante os períodos de maior afluência às urgências devido à circulação de vírus respiratórios".

Lembra que "um resultado positivo para um agente específico desencadeia decisões clínicas e logísticas imediatas" e que o laboratório de microbiologia, "em particular o de biologia molecular, funciona como uma ferramenta essencial de apoio à decisão, permitindo desbloquear rapidamente o fluxo hospitalar".

Desta forma, "a PCR em tempo real por multiplex, com resultados em menos de uma hora, permite isolar e tratar doentes com gripe ou transferi-los para áreas comuns se o resultado for negativo, libertando recursos como quartos de isolamento. Também facilita a formação de ´alas de coorte`, agrupando doentes com o mesmo vírus e otimizando o uso de camas hospitalares."

E acrescenta: "Além disso, o diagnóstico laboratorial é crucial na prevenção de surtos, protegendo os doentes mais vulneráveis e os profissionais de saúde. Contribui ainda para a contenção de custos, ao evitar o uso desnecessário de antibióticos e ao apoiar a gestão da resistência antimicrobiana."


Assim, na sua opinião, a mensagem final é clara: "É essencial investir continuamente em tecnologia de diagnóstico molecular e na formação dos profissionais que a operam, garantindo resultados fiáveis e decisões clínicas seguras".



Pedro Crespo

"O risco de transmissão diminui após o pico da doença"

Pedro Crespo, médico infeciologista na ULS-VDL e coordenador da UL-PPCIRA, é outro dos intervenientes da mesa redonda "Vigilância, prevenção e tratamento dos vírus respiratórios: Uma abordagem integrada".

Na sua opinião, "em contextos com menos recursos, os testes de antigénio são úteis por fornecerem resultados rápidos e ajudarem na identificação dos vírus envolvidos".

Por outro lado, salienta que "os testes PCR são muito eficazes no diagnóstico", mas que a sua valorização "pode levantar dúvidas em casos com evolução clínica mais prolongada, especialmente sobre a necessidade de medidas de isolamento, já que o risco de transmissão diminui após o pico de actividade da doença"


Ou seja, "como os PCR detetam pequenas quantidades de material genético, podem manter-se positivos mesmo quando o risco de contágio já é baixo", sendo certo, no entanto, que "identificar rapidamente os agentes que infectam os doentes continua a ser uma mais-valia".

Este será um dos temas abordados por Pedro Crespo no evento do dia 9 de novembro, já que a valorização destes testes nem sempre será muito clara, pois é possível continuar a testar positivo, mas já não estar numa fase de contágio ou de propagação ativa.

O especialista esclarece que "esse risco vai diminuindo rapidamente para a maior parte destes vírus. O período de maior risco de transmissão é geralmente entre 3 a 5 dias. É nessa fase inicial que ocorre o pico de atividade da doença e, a partir daí, o risco começa a reduzir. Quando tivemos de gerir os tempos de isolamento durante a pandemia, inicialmente estabeleciam-se limites como: 20 dias para formas graves, 10 dias para formas moderadas e 7 dias para formas ligeiras de doença. No entanto, é muito difícil definir esse limite com precisão."

E acrescenta: "Habitualmente, a partir do momento em que há melhoria dos sintomas, desaparecimento da febre e da sintomatologia respiratória, o risco de transmissão reduz drasticamente. Isso costuma corresponder a cerca de 5 a 7 dias após o início das queixas. Esse é também o período em que é mais importante que os doentes adotem medidas para evitar a transmissão a outras pessoas."



"É preciso coragem"


Pedro Crespo deixa ainda uma mensagem aos profissionais de saúde nesta nova temporada dos vírus respiratórios: "Para quem trabalha nesta área, é preciso coragem. Já se sabe que é uma altura do ano com maior sobrecarga. Mas, se conseguirmos manter uma abordagem correta, tanto ao nível do diagnóstico como na implementação de medidas de isolamento, conseguiremos evitar a disseminação destes vírus dentro das unidades de saúde, o que tornará tudo menos difícil de ultrapassar."

Já quanto à população em geral, o médico infeciologista lembra que "é essencial reforçar a prevenção da transmissão destas doenças" e que, "quem tiver indicação deve vacinar-se contra a gripe, COVID-19 e, em alguns casos, contra o vírus sincicial respiratório".

Sublinhando que "a vacinação reduz o risco de internamento e a gravidade da doença", acrescenta: "Se apresentar sintomas deve seguir medidas de etiqueta respiratória: tapar a boca e o nariz ao tossir ou espirrar, higienizar as mãos, usar lenços descartáveis e evitar contacto próximo. A pandemia mostrou que é possível manter a vida normal com medidas simples como o uso de máscara e a higienização regular das mãos."

Além de Raquel Marques e Pedro Crespo, participam ainda na mesa redonda dois outros especialistas: Lúcia Coimbra, da ULS Amadora-Sintra, e Rui Soares, do IPO Coimbra.


A inscrição pode ser efetuada aqui.

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