Opinião

70 anos SPMI: «O inegável papel nuclear da Medicina Interna»


Luís Campos

Presidente da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (2016-2018)



A SPMI faz 70 anos. Muitos parabéns e votos de um longo caminho pela frente.

O sucesso da SPMI é a expressão do êxito do caminho da Medina Interna em Portugal. Entre o tempo em que, nos anos 80, nos reuníamos, um pequeno grupo, juntamente com o Dr. António Barros Veloso, numa modesta divisão de um andar em Campolide, e a pujante dinâmica que a SPMI tem hoje, parece que vão anos luz.

Este caminho significa, em primeiro lugar, que houve gente com visão que soube antever a importância de manter uma especialidade generalista no hospital, num tempo em que a Medicina explodiu numa miríade de especialidades, e resgatar a Sociedade do marasmo em que tinha tombado.

Neste reinício, o destaque vai para pessoas como o Dr. Barros Veloso e o Prof. Armando Porto, mas também para o Sr. Anselmo, que soube ser o guardião da memória da SPMI, ao longo de mais de 30 anos. Depois, outros se seguiram, que souberam manter o caminho de crescimento e de afirmação que a SPMI tem atualmente.

Este caminho foi comum a alguns países do sul da Europa e, de alguma forma, também aos EUA, e foi diferente dos países da Europa Central e do Norte, e doutros continentes, como a América Latina, que fizeram da Medicina Interna um tronco comum de acesso às outras especialidades médicas, geralmente com dupla titulação.

A realidade é que o vertiginoso crescimento do conhecimento médico está a provocar a fragmentação destas especialidades médicas, fazendo com que estes médicos já tenham dificuldade em atuar como especialistas de órgão ou sistema e muito menos como internistas. Isso foi bem evidente na resposta a esta pandemia.

No caminho mais recente da SPMI, destaco a profissionalização da sua gestão, o lançamento de uma plataforma de e-learning, que tão útil foi no período pandémico, a presença da Medicina Interna nos media e a comunicação com os associados.

Também a dinamização dos núcleos de estudo e a criação de novos núcleos, o fomento de parcerias com outras entidades, como a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar, a Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, a Sociedade Espanhola de Medina Interna e a European Federation of Internal Medicine, a afirmação científica da Revista Medicina Interna e a defesa ativa de novos modelos de cuidados, em que a MI tem um papel de liderança.

Também destaco a criação de departamentos geridos pela MI, a implementação de unidades dedicadas a algumas patologias, a cogestão nos serviços cirúrgicos, a hospitalização domiciliária, um melhor aproveitamento dos hospitais de dia, a criação de unidades de alta resolução e a implementação de programas de gestão de caso para os doentes crónicos complexos. Esta defesa foi fundamental na preparação do terreno que conduziu ao sucesso da hospitalização domiciliária, por exemplo.

Também o lançamento da Festa da Saúde posicionou a Medicina Interna como protagonista na promoção da Saúde e prevenção da doença e impulsionou a comunicação entre os internistas e a comunidade.


A SPMI demonstrou também que está atenta e preocupada com as mudanças climáticas e ambientais, que já estão a provocar a morte dos nossos doentes, e foi a primeira sociedade em Portugal a defender a obrigação ética de os médicos se envolverem nesta luta.

A SPMI tem também tido um papel relevante na defesa de um maior número de internistas, na melhoria das suas condições de trabalho e da sua compensação.

É inegável o papel atual nuclear da MI nos hospitais públicos e privados, desde a urgência às enfermarias e unidades, ou na medicina ambulatória, e o futuro apresenta muitas oportunidades, porque a nossa preparação e a diversidade dos fenótipos de internistas é cada vez mais fundamental para cuidar do tipo de doentes que temos nos hospitais.


Luís Campos

No entanto, o futuro é incerto, temos que aprender a viver nessa incerteza e há ameaças ditadas por interesses corporativos que em nada beneficiam os doentes. Manter este caminho de sucesso está seguramente dependente de nós, da nossa capacidade de antecipação, dos nossos líderes, da SPMI, mas também da visão de quem gere as políticas de saúde e das condições políticas.



Artigo publicado na LIVE Especial Medicina Interna - 70 anos SPMI.

 

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