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«Casos psiquiátricos menos complexos podem ser seguidos apenas nos cuidados primários»

“O médico de família está na primeira linha de abordagem do doente psiquiátrico, logo, é necessário apostar na sua formação”, considera Maria Luísa Figueira, que preside à Comissão Organizadora do evento que terá lugar no início de fevereiro e é promovido pela Sociedade Portuguesa de Psiquiatria e Saúde Mental (SPPSM).

A responsável enfatiza, em declarações à Just News, que ficou comprovado, através da realização de vários inquéritos, que “os doentes, quando têm sintomas de natureza emocional, tendem a procurar, em primeira instância, o seu médico de família (MF), independentemente de terem noção ou não de poderem ter algum problema do foro psiquiátrico”.

Entre as queixas mais habituais estão os casos depressivos, de ansiedade, insónia, falta de concentração e de memória e falhas no rendimento intelectual. “Todas estas situações acabam por chegar, primeiro, aos colegas de Medicina Geral e Familiar. No hospital surgem os casos mais graves, que obrigam a uma ida às urgências, ou que são referenciados pelo MF”, diz.



Face a esta realidade, Maria Luísa Figueira defende que se deve apostar cada vez mais na formação destes profissionais, para que possam não só fazer o diagnóstico como instituir uma terapia psicofarmacológica adequada. “Os MF têm conhecimentos nesta área e já têm um papel ativo nas patologias menos graves.

Contudo, a Psiquiatria tem evoluído bastante, havendo novos fármacos que exigem conhecimentos específicos da sua farmacocinética e farmacodinâmica”, sublinha.

Como o MF também trata outro tipo de patologias, necessita ainda de ter em atenção as interações medicamentosas, nomeadamente destes novos psicofármacos, para que possa entender melhor o tipo de resposta ao tratamento. “Não se pode escolher apenas um fármaco, mas aquele que, de facto, pode dar resposta a determinado indivíduo em concreto”, adverte.

Como explica, “muitos dos doentes que vão ao MF têm uma doença psiquiátrica com outras comorbilidades associadas, ou apresentam sintomas de natureza emocional devido a outras patologias, isto é, não têm uma perturbação psiquiátrica isolada”.

A médica destaca ainda outra vertente importante na formação dos médicos de MGF. “Nas patologias de fronteira, nem sempre é fácil saber se se deve encaminhar o doente para a Psiquiatria ou para a Neurologia, como acontece nas demências. Aliás, esse problema é comum a outras especialidades, não é exclusivo da MGF”, observa.

Além da introdução da psicofarmacologia, na MGF também pode ser necessário referenciar para uma psicoterapia: “Neste caso, deve ter-se em atenção que não existe uma única forma ou modelo, mas vários tipos, que estão indicados para problemas específicos. A psicoterapia não
é apanágio para todas as perturbações, o que levanta problemas de referenciação e de recursos disponíveis”



Intensificar a formação faz ainda mais sentido, segundo afirma, porque “os MF estão cada vez mais assoberbados de trabalho, tendo que dar resposta a múltiplas patologias, o que implica o conhecimento de cada uma delas”. Assim, salienta, “toda a ajuda é importante, já que os casos menos complexos podem perfeitamente ser seguidos apenas nos CSP”.

No entanto, afirma ser preciso “bom senso” quando se trata de estabelecer uma ligação entre a Psiquiatria e a MGF: “Não podemos entrar na lógica de que tudo deve passar para estes médicos como já se vê noutras doenças. As especialidades hospitalares não podem delegar tudo.”

A responsável defende também a chamada consultoria entre os serviços de Psiquiatria e Saúde Mental dos hospitais e as unidades de saúde familiar (USF) e unidades de cuidados de saúde personalizados (UCSP): “Já existem alguns projetos nesse âmbito e são importantes; mas ainda não são comuns em todo o país, porque também faltam recursos humanos para dar resposta às necessidades da população.”


Encontro Nacional debate relações entre a Psiquiatria e as Neurociências

Entre 7 e 9 de fevereiro de 2019, vai realizar-se o Encontro Nacional de Psiquiatria e II Encontro das Secções, evento organizado pela SPPSM, em Coimbra. O tema central são as relações entre a Psiquiatria e as Neurociências, centradas no corpo, na pessoa e no cérebro. “Este é um tema de grande atualidade e central para a Psiquiatria nas suas relações interdisciplinares. Pretendemos que sejam discutidos os modelos de integração e os dados de evidência para uma visão não dualista das perturbações mentais”, indica Maria Luísa Figueira.

A responsável explica que corpo, pessoa e cérebro estão interligados: “Não se pode olhar para a Psiquiatria como a especialidade do cérebro, não há um órgão específico nesta área.”



Ainda neste âmbito, a médica alerta para o facto de os psiquiatras não descreverem sintomas, além de que têm de ter em conta a subjetividade de cada pessoa: “Por exemplo, não há uma depressão, mas várias. Um executivo sob stresse pode não reagir da mesma forma aos sintomas depressivos como um desempregado.”

Continuando, “o que é preciso fazer é ouvir o doente e tentar compreender o seu sofrimento, percebendo de que forma ele olha para o que sente, daí que este Encontro se centre na pessoa, no corpo e no cérebro”.

Sendo um evento multidisciplinar, Maria Luísa Figueira destaca alguns dos temas que também têm interesse na prática clínica dos médicos de MGF. “Vai-se falar de alterações do sono, comportamentos alimentares, sexualidade, perturbações do autismo, e dos primeiros sintomas que indiciam problemas mais graves, como a esquizofrenia, ou os marcadores de suicídio, entre outros.”



A entrevista completa pode ser lida na edição de dezembro do Jornal Médico dos cuidados de saúde primários.

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